quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

OS ENSEJOS DO PRÓXIMO ANO

OS ENSEJOS DO PRÓXIMO ANO
Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUÇÃO
Chegamos ao final do ano de 2010, quando se renovam os votos de um novo ano feliz e próspero. Os anseios do novo ano devem inspirar atitudes tal como a poesia acalenta o espírito, alegra a alma e transmite ao corpo sensação de bem-estar. Mas, não se deve procrastinar mais uma vez a realização da mudança de atitude, restringindo-se as promessas de fazer tudo diferente no próximo ano.
Certa vez, o filósofo, educador e teólogo Mario Sergio Cortella recomendou que, ao final do ano, cada pessoa pode escrever em um quadro os comportamentos que resultaram em erros ou desastres, em outro quadro as situações positivas e no último quadro as decisões a serem tomadas no novo ano e suas expectativas. Claro que isto é um exercício reflexivo em busca de uma tomada de consciência, evitando o precipitar de uma declaração “foi um ano ruim” ou “um ano muito bom”. Trata-se de uma forma de livrar-se do sentimento de culpa dos insucessos do ano e renovar os sonhos no próximo ano.
A beleza da alva que surge no primeiro dia do ano não deve ser contemplada com a ressaca explosiva, causada pelos excessos dos embalos das comemorações, pois, a programação de mais um ano deve começar nas primeiras horas do dia.
A partir dessas premissas, formulei algumas teses com base em experiência própria, adquirida pelo aprendizado da escuta e pelas tentativas: ensaio erro x acerto. As teses referem ao planejamento, organização, evitar desperdício e cultivar relacionamentos.
A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO
Tenho sempre ressaltado que para não ser a próxima vítima do acaso deve haver planejamento. Quem planeja acredita que é perigoso esperar pelo acaso, pois suas decisões podem ser anuladas por força de situações alheias a sua vontade. Por isto, não acredita somente no empenho e na força de vontade; pensa que suas energias e pensamentos devem ser programados de acordo com os recursos, tempo disponíveis e oportunidade.
Trata-se da arte de visualizar o objetivo a ser alcançado; ver o resultado do produto acabado antes da sua elaboração; é definir o percurso para chegar a um determinado.
Por isto, uma das queixas de muitas pessoas é o endividamento, acusando o baixo salário. Porém, há várias razões para o endividamento: para alguns é causada por compras por impulso, Ou seja, uma válvula de escape para curar a ansiedade. Sim, há pessoas que buscam curar a irritabilidade, fazendo compras por impulso sem a devida necessidade. Depois, sentem-se culpadas com as contas a pagar; recorrendo a empréstimos para pagar contas e, mesmo assim, conseguem se livrar das dívidas. Considerando que isto é vício, essas pessoas vivem infelizes, inseguras e propensas ao eterno endividamento até se curarem dessa pulsão.
Outras pessoas buscam o alpinismo social e se sacrificam para se identificarem com determinados grupos. Assim, gastam além de suas economias para adquirirem certo status. Ou seja, buscam ostentar a falsa nobreza e a sensação de bem-estar.
Ao ler uma entrevista do humorista Chico Anysio, anotei algumas dicas de economia que ele recebeu da sua ex-mulher Zélia Cardoso de Mello. Segundo seu depoimento, ele aprendeu que a melhor forma de administrar os seus recursos é o pagar as contas em dinheiro, pois, desta forma, é fácil perceber a entrada e a saída do dinheiro. Assim, é possível exercer certo controle sobre o capital, evitando o desperdício.
Como conseqüência, passei a ter um planejamento mensal e anual das contas, privilegiando o pagamento a vista, evitando as armadilhas do cheque especial, do cheque pré-datado e do cartão de crédito. Assim, o planejamento passa ter como referência os recursos reais e não fictícios, observando-se que acumular cartões de diferentes bandeiras é uma estultícia própria daqueles que primam pela ostentação.
Cultivar o estilo simples sem estar preso aos ditames da moda e da novidade é uma sugestão inteligente.  Há pessoas que são vorazes em comprar o último lançamento de celular, roupa sem calcular suas possibilidades com tiverem uma fonte inesgotável de recursos.
O planejamento não envolve só dinheiro. É possível planejar o tempo e a realização dos sonhos. O estilo de vida desregrado é pretexto para se chegar atrasado aos compromissos e cumprir os prazos prometidos. O planejamento possibilita que as coisas obedeçam a uma seqüência lógica de tempo, possibilitando o atendimento a demanda e a previdência dos percalços.
Quando alguém é uma personalidade suas demandas aumentam, tornando-se prejudicado o tempo e sua privacidade é interrompida por incessantes toques de celular.  A disciplina é o remédio para que os contextos não se confundam: vida pessoal e profissional no seu devido lugar e momento. As necessidades têm pressa, mas as demandas podem ser programadas para ser encaminhadas no seu devido tempo, sem o stress do urgentíssimo. Aliás, o planejamento cancela todas as desculpas do urgente – urgentíssimo.

ORGANIZAR AS PRIORIDADES A PARTIR DO QUE É ESSENCIAL
Umas das passagens veneráveis do livro do profeta Isaías capítulo 55, versículo 2 recomenda a administração financeira por prioridade, citando a alimentação.  Aliás, muitas parábolas, citadas nos Evangelhos, tratam direta e indiretamente de administração financeira como, por exemplo: a parábola dos talentos, da minas, do fermento, da semente, etc. São temas que abordam matéria prima, investimento e lucro. Assim, vão contra a mentalidade pedante de se prender ao acaso, sem os recursos do esforço da inteligência e da engenharia administrativa e da oportunidade. 
A vida deve se organizar a partir de prioridades: aquilo que é essencial, depois o que é necessário, partindo para o que é importante e o interessante.
O essencial está relacionado à matéria-prima das necessidades. Está relacionado à aspiração da vida que se constrói no dia-a-dia: a alimentação, o vestuário e a habitação. Definir o que é essencial é identificar a dignidade da pessoa; é ver que sem o atendimento a essas necessidades o homem está condenado à indigência.
Depois, supridas as carências do essencial pode-se buscar o que é necessário: a educação, por exemplo. O bom emprego é proporcional ao valor do diploma, do mérito e da oportunidade. Pelo estudo sistemático chega-se a universidade e obtém-se o diploma, porém isto não é tudo. Deve-se provar o conhecimento adquirido e abraçar as oportunidades que surgirem. Deixar passar as oportunidades é esquecer de acordar para viver o sonho.  Por isto, o necessário valoriza o essencial e possibilita buscar o que é importante e interessante.
As necessidades humanas não se esgotam, porque o homem não quer apenas viver, quer viver bem e com conforto. Assim, o essencial ganha sofisticação e passa a significar “luxo”.
Organizar as prioridades a partir do essencial é reconhecer seus próprios limites. Viver cada momento a seu tempo sem arroubos de soberba e esnobismo. É aguardar a sua vez na história, sem pressa pois cada momento é propício para ser feliz.  
EVITAR O DESPERDÍCIO
É preciso reconhecer que a nossa vida é feita de valores que não podem ser desperdiçados. A dignidade construída no labor histórico de dificuldades não pode ser banalizada por um momento de prazer. Desta forma, muitos têm traspassado a sua alma e provado o sabor da morte.
Por isto, toda a energia de uma vida não deve ser apagada em um momento, quando as dores chegarem cobrando o salário do uso indevido das drogas: álcool, cigarro, barbitúricos e substâncias tóxicas diversas. A energia se esgota quando a natureza do corpo é maltratada por noites perdidas, má alimentação e toda forma de excessos. A vida é um bem raro que não deve ser desperdiçada. Sim, deve ser vivida com cuidado e poesia.
A mente deve ser povoada de bons pensamentos, sem as pragas daninhas trazidas pelo mau uso da internet, da televisão e de certas literaturas. A leitura de um bom livro traz conhecimento e ilumina a alma, libertando-a da ignorância. Por isto, concordo com Myles Munroe quando diz que comprar livros é mais importante do que comprar comida. Ou seja, a comida demora seis horas no organismo, mas o conhecimento dura toda vida.
Valorizar o produto do seu trabalho é evitar o desperdício das sobras de alimentos, compras de roupas que não se vai usar, produtos encalhados no canto da casa. Convém lembrar de um pensamento anônimo: “onde há sobra tem desperdício; onde há fartura tem falta, pois quando todos se alimentam e se fartam não há falta”. “Ou seja, enquanto comidas aqui são jogadas fora em outros lugares pobres há gente passando fome”. Reflita.
CULTIVAR RELACIONAMENTO
O homem é um ser de origem gregária. Ou seja, não consegue viver sozinho sem cultivar relacionamento. Contudo, vivemos em comunidade marcada pela diversidade em todos os sentidos e essas diferenças nos forçam ao diálogo pelo entendimento do outro, sua força de pensar, de ser e agir.
É possível que eu seja conhecido de muitos, mas, alguns deles, escolhi para serem meus amigos. Por quê. Pela aproximação descobri a afinidade, traços comuns e a inspiração. A definição para amizade dada por Mike Murdock é interessante: “a amizade é uma forma de premiar a lealdade e a confiança”. Bem sei que nem todas as pessoas conhecidas são minhas amigas apesar dos bons valores que cultivam e a idoneidade que possuem, pois é uma questão de escolha pessoal. Contudo, a universalidade do respeito à pessoa prevalece na relação entre conhecidos e amigos.
A relação cordial, afetuosa e sincera no trabalho, na igreja e em outras instituições é uma necessidade lógica. É salutar vivenciar relações duradouras, comunicando parcerias e exercendo a tolerância recíproca.
Assim, cultivar relacionamentos no novo ano é salutar para perceber que paz é comunhão e não isolamento, que a felicidade é para ser compartilhada sem constrangimentos e que a vida se frutifica quando nos aproximamos uns dos outros de forma fraterna.
CONCLUSÃO
Viver o próximo ano é um desafio a ser enfrentado com receitas antigas, mas com novas atitudes. Por isto, o planejamento deve estar associado a organização em todos os sentidos, evitando o desperdício e cultivando relacionamentos.

REFERÊNCIAS:
Sugiro a ver a serie de TV: Filosofia, um guia para a felicidade. Apresentada por Alain de Botton no canal da TV Escola.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA

Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUÇÃO
Nos tempos de estudante universitário, fui introduzido à pedagogia humanista de Carls Ramson Rogers (1902 - 1987) por meio de um professor provocativo que desafiava os alunos a não aceitarem as informações prontas, a exercitar as percepções do mundo ao redor e extrair dele um novo conhecimento. Ele inaugurava uma aprendizagem centrada no aluno que revelava seus conteúdos vivos, porém precários, os quais eram sistematizados pela intervenção de insight do mediador desse conhecimento.
Assim, a aprendizagem era uma descoberta das motivações, dos sentimentos e do outro por meio de exercícios progressivos de escuta. Era renunciar a própria verdade e colocar-se no lugar do outro, procurando entendê-lo sem autoritarismos e imposições. O exercício da autonomia não era um conceito abstrato dos livros e dos projetos, mas um objetivo a ser perseguido: o aluno ser o orientador do seu próprio conhecimento, quando descobrir-se enquanto pessoa em desenvolvimento pleno. Aliás, definir “desenvolvimento pleno” ultrapassa a objetividade de um conceito; ou seja, é um processo contínuo de autodescoberta, é analítico, reflexivo e orienta um ciclo de vida. Por isto, não é um conceito é uma abordagem, um jeito de ser, uma filosofia de vida.
Como conseqüência, eu já estava incluso em grupo de alunos que se declaravam rogerianos não pelo estilo de vida, mas pela busca de resposta e leitura incessantes de obras inspiradas na pedagogia, filosofia e psicologia de Carls Rogers. Dentre essas obras, cito os escritos do professor e jurista João Baptista Herkenhof e do psicólogo Jhon Keith Wood (1983).
Dessas obras, extrai as quatro teses do direito da pessoa ao respeito. Aliás, tanto a filosofia como a pedagogia humanista estão calcadas na fenomenologia e o existencialismo, inaugurado pelo filósofo e pastor protestante Martin Heidegger (1889 – 1976) que influenciou as obras de Jean Paul Sarte (1905 - 1980) e, também, Karl Rogers.
O direito da pessoa ao respeito vem sendo citado por mim nas conversas e orientam muitas decisões que tenho tomado na vida.
O DIREITO DE SER
No mundo atual, ainda prevalece a idéia do homem padrão, suscitando imagens e imposições de conduta e de representações. A emulação vem sendo a tônica e as pessoas copiam tendências e estilos querendo identificar-se com determinados grupos em busca do status. Nesse caso, a pretensa necessidade de aceitação gera uma crise de identidade, sendo corrente a ausência de autenticidade quando se quer parecer com alguém. Assim, há pessoas que não se decidem sem uma segunda opinião.
Há pessoas que tentam se rebelar contra a hegemonia da ditadura da moda, da magreza e da imposição de etiquetas sociais, querendo assumir o protagonismo de suas decisões, sem a interferência de terceiros.
O Direito de Ser é uma via de mão dupla porque depende da redescoberta do EU, sem o vírus do egoísmo, do individualismo, do esnobismo ou da autocomiseração. É conseqüência de um “continuum”; isto é, um crescimento pessoal em direção a autonomia. Isso depende de um “feedback” (retorno da informação) da relação com outro. Aliás, é impossível crescer sem essa troca de informações a qual possibilita o reconhecimento dos seus defeitos e possibilidades.
Quando há o reconhecimento do direito de ser não há agressão, opressão nem imposições. É a redescoberta do exercício da liberdade em seu sentido pleno. Há quem diga que na liberdade não há limites porque o direito do outro caminha junto com o seu, bem como as conquistas e seja verdadeira a consciência de que qualquer agressão ao direito tem conseqüências recíprocas.
O direito de ser não anula valores nem discrimina o outro. As diferenças de opinião e o jeito de ser são respeitados, validando a variedade que existe entre os seres humanos.  É o respeito ao livre-arbítrio da pessoa ser o que ela é não o que os outros querem.    
O DIREITO DE SONHAR
Todo ser humano tem o direito de desejar o melhor para sua vida, independente das opiniões dos outros. As opiniões, quando solicitadas, são válidas e qualifica a avaliação das possibilidades do sonho. Aliás, sonhar faz parte da essência humana, pois quando alguém deixa de sonhar sua vida perde o significado. Por isto, sempre tem alguém fazendo planos de ter um carro, uma casa, um emprego melhor; ou seja, o sonho é algo transcendente como a fé e inaugura possibilidades.
Há quem diga que você pode não realizar o seu sonho, mas chegará bem perto dele. Por isto, é necessário sonhar para descobrir significados e motivações. Claro, o sonho é capitalista e sua realização exige um preço não calculado. Imagine quanto custa a perda de horas de sono, da ansiedade, da privação do prazer até a conclusão de um curso superior. Há sempre o deboche com quem exerce um cargo público, mas nunca é perguntado qual é o preço da realização do seu sonho.
Antigamente as mulheres eram privadas de sonhar porque o seu destino era determinado pelos pais. Eram condicionadas a desejar ter um bom marido e serem boas donas de casa. Lamentalmente, ainda existe resquício desse autoritarismo contra as mulheres que, quando casam, são proibidas de trabalhar fora.
O direito de sonhar inaugura as possibilidades do futuro e faz a pessoa ser protagonista da sua história, sem interferência ou imposições.
O DIREITO DE QUERER
Percebo nas manchetes dos jornais tragédias causadas por ex-namorados e ex-maridos que não aceitam a separação e querem impor às mulheres sua vontade e, não conseguindo, realizar o intento partem para a violência moral e física e até à morte.
O instinto de dominação faz que alguém queira a supremacia sobre o outro, inclusive no sentimento e na vontade. A tática da mentira tem favorecido à escravidão da mente dos incautos, presas fáceis do materialismo do capital e do desejo de ascensão social. Há homens e mulheres que se sujeitam a caprichos de outras pessoas, passando por cima da propalada dignidade e da coerência.  Contudo, a verdade liberta como a luz espanta as trevas da escuridão dando possibilidade de alguém andar sem tatear ou amparar-se em alguém.
O maior bem que alguém possa querer é a liberdade, a paz e a consciência tranqüila. O desejo do bem-estar e do conforto não deve ser pretexto para nulidade da individualidade. Claro, querer realizar um sonho depende de planejamento e análise da viabilidade dos recursos.  O direito de querer não pode ser ilógico. Doutro modo, vira obsessão e loucura.
Querer é o exercício da vontade com responsabilidade ao direito do outro ao respeito. A realização da vontade não deve ser mesquinha ou invejosa, querendo copiar a história de alguém. Assim, quando alguém se descobre pessoa em desenvolvimento pleno consegue equilibrar sentimento, vontade, intelecto e ação.
O DIREITO DE VIVER
Fazer da existência uma prática de liberdade não significa fazer o que quer. É como se visse desenrolar diante si a sua história como um filme, sendo colocadas as opções de sucesso e fracasso. É possível visualizar uma história de vida ao longo dos anos. Para isto serve os sonhos: para desenhar uma realidade desejável.
Viver a vida é caminhar a trilha da existência, banhada por um sol de decisões conscientes. Não é a ausência do erro ou até mesmo de fracasso, mas é a capacidade de extrair aprendizados para os próximos passos na trilha sonora da transcendência. Aliás, é teológico pensar como é espiritual sentir a beleza da alma fruir diante dos nossos olhos. A interioridade dos sentimentos e seus significados nos tornam humanos e nos leva a compreender uns aos outros.
O direito de viver não conduz ao isolamento, mas a solidariedade do respeito à vida, sem o escárnio das diferenças do outro. Aliás somos uma orquestra. Cada ser humano é um instrumento diferente com sonoridades distintas que o criador pretende reuni-los como uma orquestra para apresentar o espetáculo da urbanidade e da tolerância.
O direito de viver é descobrir a simplicidade das coisas, da natureza. A maior natureza de Deus é você e sua vida não deve ser maltratada, destruída e extinta. Que pena, se o homem destrói o outro ser humano que é a natureza, quanto mais os animais e a floresta.
CONCLUSÃO
Sou livre, a vida me contenta com os seus desafios. Estou pessoa em desenvolvimento em pleno: o que sou parte de um desígnio, de uma visão que me leva a um propósito. Estou aprendendo a ser natureza de Deus.
Convido a todos a refletir sobre o direito da pessoa ao respeito, Se policiar quanto aos sentimentos de raiva – expor a raiva sem as conotações de vingança e intolerância –, palavras ofensivas e atitudes impetuosas. O exercício do feedback, é deixar o outro falar até esgotar a fonte dos seus sentimentos e se manifestar por uma leitura do sentimento do outro, sem aquele mecanismo da retaliação, do ego ferido. A compreensão da raiva do outro é o ponto de partida para inaugurar as possibilidades de entendimento e concórdia. Aparentemente, o pensamento conservador julga ser uma atitude condescendente e covarde, mas Nelson Mandela mostrou que o diálogo entre inimigos parte do reconhecimento da integridade do outro, zerando as motivações da justiça e injustiça, apontando o caminho para o perdão.
A abordagem centrada na pessoa leva o reconhecimento do respeito. Mas em sociedade contaminada pelo individualismo, torna-se necessário que o respeito seja a tônica para a suplantação das desigualdades e intolerâncias

REFERÊNCIAS
Recomendo as leituras dos livros sobre a prática não diretiva como:
WOOD, Jhon Keith. A abordagem centrada na pessoa. Vitória: Edufes, 2008.
Acesso a outras obras sobre a pedagogia humanista.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

É PRECISO DESACELERAR

É PRECISO DESACELERAR
Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUÇÃO
Fico impressionado com a valorização excessiva do imediato como se tudo na vida estivesse enquadrado em uma reengenharia gerencial para a eficácia dos resultados. Desta forma, a pregação contra o desperdício do tempo não é antagônica ao valor dado as futilidades, mas um combate ferrenho ao ócio agradável. Aliás, a apreensão do mundo com os detalhes e significados é tão marginalizada que alguns são classificados de loucos e alienados.
A leitura do mundo, apregoada por Paulo Freire (1921 – 1997), exige uma meditação progressiva das diferentes formas e cores que nos cercam; é construir relações e estabelecer significados entre o homem, a natureza, os sentimentos e novas formas de pensamento. Essa leitura exige considerar o homem parte integrante da natureza e agente da comunicação. Vale ressaltar que há muitos diálogos, discussões, mas pouca comunicação, visto que as pessoas não aprenderam a escutar. A arte de escutar leva ao entendimento e a compreensão do sentimento do outro, firmando convenções de parcerias para atender a um bem comum. Lamentavelmente, há pessoas que se preparam para confrontar com as idéias e derrubar a tese do outro e, se possível, vencer no grito e pelo cansaço. Em uma verdadeira escuta não há perdedores, não há abatidos nem constrangimentos, pois ouvir é uma atitude de autoconhecimento na perspectiva do outro. Assim, as nossas virtudes e defeitos aparecem quando nos relacionamos com as pessoas.
Por isto, a pressa é um obstáculo à comunicação, que é um meio de aproximar pessoas. Parece que é mais fácil utilizar coisas para se comunicar, sem o contato com alguém, atribuindo personalidade aos papéis e documentos que recebem prerrogativas de fé, superiores as de qualquer indivíduo. Em tempos passados, bastava uma palavra e aperto de mãos para firmar compromisso. Hoje são necessários inúmeros papéis, assinaturas e testemunhas e, quando isto não vale, exige-se registro em cartório. Ou seja, o ser humano está se despojando de argumento moral e solicitando como fiador inúmeros documentos.
É PRECISO DESACELERAR A ANSIEDADE PELO IMEDIATO
A cultura do imediato busca remediar e queimar etapas, valorizando o resultado e ignorando a essência presente na análise cuidadosa do processo. Claro, a vivência de cada etapa assemelha a torrente da vida e revela um crescimento sadio do aprendizado. Nesse arremedo de fases, o tempo não pode ser incriminado como inimigo das ambições e traidor das aspirações ardentes das pessoas presentes na arena de poder. Essa imputação de culpa é um álibi para a ansiedade resultante das expectativas frustradas.
Gosto de observar a natureza, sem pressa. Parece que somente o tempo passa enquanto as árvores dançam ao murmúrio do vento, os animais vivem cada momento sem capitular a insegurança do alimento diário. A ausente preocupação da natureza forja a máxima de que somente o ser humano vive seu momento como se desfrutasse do último manjar do dia. Nesse caso, o amanhã é tão presente que suas tarefas estão determinadas na agenda.  Por isto, é desejoso que os dias e horas atrasem para o bem-estar dos homens e mulheres de negócios, estressados com o feitio de carregar seguidores de instruções e recomendações. Costumo lembrar de um pensamento do filósofo Rubem Alves de que os dias são longos para as crianças e curtos para os adultos. Por quê? As crianças resolvem seus problemas de forma lúdica enquanto que os adultos são causadores de crises e tentam resolver seus problemas por meio de discussões, documentos, instituições e instâncias de juízo.
Fico na expectativa de ouvir os anciãos, pois a vida deles desacelerou. São eles contadores de histórias, vacilantes no relato das tristezas, mas vigorosos no retrato das vitórias da vida.  O sorriso dos idosos mostra que há erros possíveis de serem atravessados e chegar com vitalidade no final da vida para contar histórias. Assim, é possível acreditar que a ansiedade dura um momento, pois a experiência mostra que há esperança de superar as tribulações, oriundas dos embaraços que nos cercam.
É PRECISO DESACELERAR A AGITAÇÃO DO TRABALHO
As doenças mais relacionadas ao trabalho são: o stress, a estafa, tendo como sintomas a irritabilidade, a insônia e perturbação mental. O argumento mais utilizado é o senso de responsabilidade. Deste modo, a alegação de escravo do trabalho faz a distância da família e, até mesmo, dos problemas pessoais pela substituição de uma alienação por outra.
A agenda de trabalho é o mote para ilustrar carga de responsabilidade: reuniões, compromissos e representações. Aliás, preencher os espaços de mobilização política não é questão de visibilidade, mas de status, de presença e de identificação com pessoas e contextos, tanto do ponto da convergência como da divergência.
Já ouvi relatos de pessoas que alegam necessidade de trabalhar dia e noite para ganhar dinheiro com o propósito de sustentar a família ou ter um razoável conforto. Via de regra, esse esforço não proporcionou resultados imediatos nem duradouros. Há aqueles entram pelo caminho da bajulação como meio de chamar a atenção e conseguir atalhos para o sucesso profissional. Assim, quem faz essa opção é tentado a transigir com o erro, a negar princípios e a própria identidade, passando a representar um papel da submissão cega. Em todos os casos que conheço, no final persistiu o sentimento de traição, de ter sido usado até perder a importância para o esquema de poder. A sensação de conforto da bajulação é alienante o que torna a frustração mais dolorosa.
Talvez, a inveja seja uma das causa de maior ansiedade no trabalho. Segundo definição, a inveja faz a pessoa desejar ardorosamente estar no lugar do outro. Por isto, em uma escala progressiva, os invejosos são capazes até de matar por causa da sua pequenez e sua noção de incapacidade.
É preciso desacelerar no trabalho as sensações de incapacidade, os pretextos do assédio moral e busca constante da eficiência até as últimas conseqüências.  É preciso humanizar o trabalho, privilegiar as relações entre as pessoas e não a frieza das obrigações. Hoje, fala-se da coisificação do homem e a humanização das coisas, principalmente por causa da substituição do homem pela máquina e pela forma como ela torna vida quase autônoma. O homem acaba ficando dependente da máquina. Imagine como ficaria o trabalho sem o computador e outros equipamentos de mídia e da eletrônica? A máquina acelerou o trabalho e curvou o homem a todos os caprichos.
É PRECISO DESACELERAR A MILITÂNCIA
Fico impressionado com tantos movimentos por direitos tanto na área da educação, da assistência social, da criança e do adolescente, das pessoas com deficiência, etc. Se fosse atender a todos os convites teria que abdicar do meu trabalho e da família. Também, a cada encontro vejo estante de livros à venda, além daqueles que recebo como bonificação. As informações que recebo me sensibilizam, mas não consigo me ver envolvido de forma apaixonante nas causas que me são apresentadas. O envolvimento afetivo com essas causas reclama por paixão ou militância. Costumo dizer que ter paixão é buscar uma razão para sofrer ou uma causa para, se possível, morrer por ela. Isto implica em renúncia aos momentos de lazer com a família, o descanso e incorporar uma crença.
Creio que todos nós somos resultados de um conjunto de ideias; que, por sua vez, constituem filosofia de vida e orientam condutas e estilo de vida. Por isto, envolver-se com uma causa é ser despertado por uma vocação, motivado por uma paixão que se destina a um propósito. A visão do propósito é que dá consciência do lugar onde se pretende chegar.
Percebo que a militância é exclusiva para poucos, devido a acomodação de muitos. Assim, há pessoas que se ocupam de vários papeis ao mesmo tempo como quisessem suprir a ausência de engajamento dos outros. A tese de ocupar todos os espaços porque os outros não querem é trágica e ridícula.
É preciso desacelerar para que a vida tenha sabor para além da sensação de purgar a culpa de abandono ao próximo e ser compadecente com as tragédias dos outros. É preciso desacelerar para usufruir da prática da bondade na medida certa; da busca da justiça com a equidade da saúde do corpo e da mente.
CONCLUSÃO
Não vou concluir a tese, mas convidar a todos a pensar os dias trabalhosos e sua aflição de espírito. Convido a refletir sobre a brevidade da vida e pensar a filosofia do carpie dien: “Viver intensamente cada dia como se estivesse colhendo um fruto saboroso”.

REFERÊNCIAS
Recomendo as leituras dos textos de Rubem Alves: http://www.rubemalves.com.br/