
Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUÇÃO
Nos tempos de estudante universitário, fui introduzido à pedagogia humanista de Carls Ramson Rogers (1902 - 1987) por meio de um professor provocativo que desafiava os alunos a não aceitarem as informações prontas, a exercitar as percepções do mundo ao redor e extrair dele um novo conhecimento. Ele inaugurava uma aprendizagem centrada no aluno que revelava seus conteúdos vivos, porém precários, os quais eram sistematizados pela intervenção de insight do mediador desse conhecimento.
Assim, a aprendizagem era uma descoberta das motivações, dos sentimentos e do outro por meio de exercícios progressivos de escuta. Era renunciar a própria verdade e colocar-se no lugar do outro, procurando entendê-lo sem autoritarismos e imposições. O exercício da autonomia não era um conceito abstrato dos livros e dos projetos, mas um objetivo a ser perseguido: o aluno ser o orientador do seu próprio conhecimento, quando descobrir-se enquanto pessoa em desenvolvimento pleno. Aliás, definir “desenvolvimento pleno” ultrapassa a objetividade de um conceito; ou seja, é um processo contínuo de autodescoberta, é analítico, reflexivo e orienta um ciclo de vida. Por isto, não é um conceito é uma abordagem, um jeito de ser, uma filosofia de vida.
Como conseqüência, eu já estava incluso em grupo de alunos que se declaravam rogerianos não pelo estilo de vida, mas pela busca de resposta e leitura incessantes de obras inspiradas na pedagogia, filosofia e psicologia de Carls Rogers. Dentre essas obras, cito os escritos do professor e jurista João Baptista Herkenhof e do psicólogo Jhon Keith Wood (1983).
Dessas obras, extrai as quatro teses do direito da pessoa ao respeito. Aliás, tanto a filosofia como a pedagogia humanista estão calcadas na fenomenologia e o existencialismo, inaugurado pelo filósofo e pastor protestante Martin Heidegger (1889 – 1976) que influenciou as obras de Jean Paul Sarte (1905 - 1980) e, também, Karl Rogers.
O direito da pessoa ao respeito vem sendo citado por mim nas conversas e orientam muitas decisões que tenho tomado na vida.
O DIREITO DE SER
No mundo atual, ainda prevalece a idéia do homem padrão, suscitando imagens e imposições de conduta e de representações. A emulação vem sendo a tônica e as pessoas copiam tendências e estilos querendo identificar-se com determinados grupos em busca do status. Nesse caso, a pretensa necessidade de aceitação gera uma crise de identidade, sendo corrente a ausência de autenticidade quando se quer parecer com alguém. Assim, há pessoas que não se decidem sem uma segunda opinião.
Há pessoas que tentam se rebelar contra a hegemonia da ditadura da moda, da magreza e da imposição de etiquetas sociais, querendo assumir o protagonismo de suas decisões, sem a interferência de terceiros.
O Direito de Ser é uma via de mão dupla porque depende da redescoberta do EU, sem o vírus do egoísmo, do individualismo, do esnobismo ou da autocomiseração. É conseqüência de um “continuum”; isto é, um crescimento pessoal em direção a autonomia. Isso depende de um “feedback” (retorno da informação) da relação com outro. Aliás, é impossível crescer sem essa troca de informações a qual possibilita o reconhecimento dos seus defeitos e possibilidades.
Quando há o reconhecimento do direito de ser não há agressão, opressão nem imposições. É a redescoberta do exercício da liberdade em seu sentido pleno. Há quem diga que na liberdade não há limites porque o direito do outro caminha junto com o seu, bem como as conquistas e seja verdadeira a consciência de que qualquer agressão ao direito tem conseqüências recíprocas.
O direito de ser não anula valores nem discrimina o outro. As diferenças de opinião e o jeito de ser são respeitados, validando a variedade que existe entre os seres humanos. É o respeito ao livre-arbítrio da pessoa ser o que ela é não o que os outros querem.
O DIREITO DE SONHAR
Todo ser humano tem o direito de desejar o melhor para sua vida, independente das opiniões dos outros. As opiniões, quando solicitadas, são válidas e qualifica a avaliação das possibilidades do sonho. Aliás, sonhar faz parte da essência humana, pois quando alguém deixa de sonhar sua vida perde o significado. Por isto, sempre tem alguém fazendo planos de ter um carro, uma casa, um emprego melhor; ou seja, o sonho é algo transcendente como a fé e inaugura possibilidades.
Há quem diga que você pode não realizar o seu sonho, mas chegará bem perto dele. Por isto, é necessário sonhar para descobrir significados e motivações. Claro, o sonho é capitalista e sua realização exige um preço não calculado. Imagine quanto custa a perda de horas de sono, da ansiedade, da privação do prazer até a conclusão de um curso superior. Há sempre o deboche com quem exerce um cargo público, mas nunca é perguntado qual é o preço da realização do seu sonho.
Antigamente as mulheres eram privadas de sonhar porque o seu destino era determinado pelos pais. Eram condicionadas a desejar ter um bom marido e serem boas donas de casa. Lamentalmente, ainda existe resquício desse autoritarismo contra as mulheres que, quando casam, são proibidas de trabalhar fora.
O direito de sonhar inaugura as possibilidades do futuro e faz a pessoa ser protagonista da sua história, sem interferência ou imposições.
O DIREITO DE QUERER
Percebo nas manchetes dos jornais tragédias causadas por ex-namorados e ex-maridos que não aceitam a separação e querem impor às mulheres sua vontade e, não conseguindo, realizar o intento partem para a violência moral e física e até à morte.
O instinto de dominação faz que alguém queira a supremacia sobre o outro, inclusive no sentimento e na vontade. A tática da mentira tem favorecido à escravidão da mente dos incautos, presas fáceis do materialismo do capital e do desejo de ascensão social. Há homens e mulheres que se sujeitam a caprichos de outras pessoas, passando por cima da propalada dignidade e da coerência. Contudo, a verdade liberta como a luz espanta as trevas da escuridão dando possibilidade de alguém andar sem tatear ou amparar-se em alguém.
O maior bem que alguém possa querer é a liberdade, a paz e a consciência tranqüila. O desejo do bem-estar e do conforto não deve ser pretexto para nulidade da individualidade. Claro, querer realizar um sonho depende de planejamento e análise da viabilidade dos recursos. O direito de querer não pode ser ilógico. Doutro modo, vira obsessão e loucura.
Querer é o exercício da vontade com responsabilidade ao direito do outro ao respeito. A realização da vontade não deve ser mesquinha ou invejosa, querendo copiar a história de alguém. Assim, quando alguém se descobre pessoa em desenvolvimento pleno consegue equilibrar sentimento, vontade, intelecto e ação.
O DIREITO DE VIVER
Fazer da existência uma prática de liberdade não significa fazer o que quer. É como se visse desenrolar diante si a sua história como um filme, sendo colocadas as opções de sucesso e fracasso. É possível visualizar uma história de vida ao longo dos anos. Para isto serve os sonhos: para desenhar uma realidade desejável.
Viver a vida é caminhar a trilha da existência, banhada por um sol de decisões conscientes. Não é a ausência do erro ou até mesmo de fracasso, mas é a capacidade de extrair aprendizados para os próximos passos na trilha sonora da transcendência. Aliás, é teológico pensar como é espiritual sentir a beleza da alma fruir diante dos nossos olhos. A interioridade dos sentimentos e seus significados nos tornam humanos e nos leva a compreender uns aos outros.
O direito de viver não conduz ao isolamento, mas a solidariedade do respeito à vida, sem o escárnio das diferenças do outro. Aliás somos uma orquestra. Cada ser humano é um instrumento diferente com sonoridades distintas que o criador pretende reuni-los como uma orquestra para apresentar o espetáculo da urbanidade e da tolerância.
O direito de viver é descobrir a simplicidade das coisas, da natureza. A maior natureza de Deus é você e sua vida não deve ser maltratada, destruída e extinta. Que pena, se o homem destrói o outro ser humano que é a natureza, quanto mais os animais e a floresta.
CONCLUSÃO
Sou livre, a vida me contenta com os seus desafios. Estou pessoa em desenvolvimento em pleno: o que sou parte de um desígnio, de uma visão que me leva a um propósito. Estou aprendendo a ser natureza de Deus.
Convido a todos a refletir sobre o direito da pessoa ao respeito, Se policiar quanto aos sentimentos de raiva – expor a raiva sem as conotações de vingança e intolerância –, palavras ofensivas e atitudes impetuosas. O exercício do feedback, é deixar o outro falar até esgotar a fonte dos seus sentimentos e se manifestar por uma leitura do sentimento do outro, sem aquele mecanismo da retaliação, do ego ferido. A compreensão da raiva do outro é o ponto de partida para inaugurar as possibilidades de entendimento e concórdia. Aparentemente, o pensamento conservador julga ser uma atitude condescendente e covarde, mas Nelson Mandela mostrou que o diálogo entre inimigos parte do reconhecimento da integridade do outro, zerando as motivações da justiça e injustiça, apontando o caminho para o perdão.
A abordagem centrada na pessoa leva o reconhecimento do respeito. Mas em sociedade contaminada pelo individualismo, torna-se necessário que o respeito seja a tônica para a suplantação das desigualdades e intolerâncias
REFERÊNCIAS
Recomendo as leituras dos livros sobre a prática não diretiva como:
WOOD, Jhon Keith. A abordagem centrada na pessoa. Vitória: Edufes, 2008.
Acesso a outras obras sobre a pedagogia humanista.
Depois desta leitura, observei que por muitas vezes não queremos ser livres por imposição de uma sociedade capitalista que nos escraviza ao consumismo, nos deixando pessoas céticas, principalmente em relação ao nosso próximo, imperando a individualidade egoísta. Pessoalmente, essa reflexão do meu amigo Gelcimar, mostrou que podemos ser livres ou escravos deste mundo e isso dependerá do que somos, sonhamos, queremos e vivemos.
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