
Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUÇÃO
Gosto de falar de sonhos, pois eles abrem as janelas da alma, reacendem a chama da existência e criam significados para a vida. Aliás, a vida só tem sentido se for revestida de propósito. Ninguém existe simplesmente por existir. Há uma razão para a existência que remota para a origem de cada ser humano e vai além da discussão da ascendência, pois passa pela transcendência que nos envolve. Contudo, falar do transcendente, do espiritual ultrapassa a dimensão da matéria. Por isto, muitos têm receio de se aventurar nessa área e estão propensos a afirmar: “são coisas de metafísicos fanáticos”.
FLERTAR COM A ESPERANÇA
A esperança não surge do nada. Ela é fundamentada em uma crença que, por sua vez, orienta uma filosofia de vida. Ou seja, eu sou aquilo que acredito e isto vai definir o passo a ser dado, o meu futuro. Ninguém consegue viver sem uma crença ou uma ideologia: cristãos, místicos, ateus, judeus, gentios, ricos e pobres, etc. Apesar dos materialistas apontarem foco da sua esperança na emperia e a ciência; contudo, acredito nos mistérios da alma invisível, reclamando por imortalidade. Sou forjado a acreditar no dualismo da existência: matéria e espírito. Por isto, penso na forma que a alma se materializa por meio dos sonhos, viajando por lugares repletos por sombras ou por cores no desenho dos desejos ou revelando mistérios ou enigmas.
Falar do sonho é flertar com a esperança que, por sua vez, aponta para o futuro e abre as cortinas da eternidade. A esperança é uma das três virtudes mais excelentes do Cristianismo e, para ela, a morte é apenas um eufemismo. Por isto, me visto de esperança todos os dias ao acordar mesmo tendo consciência da brevidade da vida. Acredito que a esperança dá novo significado à vida, revestindo-a de imortalidade. Assim, a crueza da vivência diária não se contamina pelo desespero, pois estará amparada na crença de que o choro cessará ao raiar do novo dia.
Ter esperança não é viver alienado à espera do milagre ou ter um otimismo ingênuo. A esperança é a virtude que empurra o ser humano superar os desafios e o combustível da fé para se alcançar os vôos altos nos horizontes da vida. As pessoas otimistas acreditam nos seus sonhos e reúnem energia e esforços para realizá-los apesar das dores e lágrimas. Mesmo com todo o sofrimento sabem que com alegria colherão os frutos saborosos da felicidade.
O mar é uma das ilustrações mais aplicadas a nossa existência. Claro, o mar tem senso de humor impressionante e, mesmo com os dias calmos e tempestuosos, conserva a sua grandeza e humildade. Assim, a nossa vida tem momentos de dificuldades que nos roubam a energia, a saúde e até mesmo os bens, mas não pode roubar a fé e a esperança que é o nosso salvo conduto para a nossa ressurreição física, emocional e espiritual. Às vezes, a carne se consome pelas enfermidades e moléstias de toda sorte, porém ninguém pode matar a esperança. Só a pessoa afligida que pode debilitá-la e fazê-la fenecer, mas, se der oportunidade para a fé, ela pode renascer das cinzas e trazer à luz a existência.
Fico na espreita de que amanhã raiará o sol da liberdade. Há coisas que conspiram contra a esperança como, por exemplo, a persistência da adversidade consume todas as forças e energias e tendem a roubar a fé. Mas, não vou cessar de ouvir a música de Deus nos meus momentos tristes nem ficar alimentando pensamentos de autocomiseração na fria sala do meu quarto. Vou me ungir com os ungüentos da graça e me vestir de alegria ao despertar para o novo dia.
Lembro-me da infância dos sonhos de exercer diferentes profissões. Agora vejo que não consegui realizar o sonho em nenhuma dessas profissões, mas cheguei bem perto. Claro, o sonho é uma aposta, um caminho e não um lugar e uma proposta que se constrói no caminho no caminhar. De outro modo, sua realização não envolveria esforços emocionais, intelectuais e físicos. Convém ressaltar que alguns conseguiram chegar ao seu sonho por saber administrar bem as oportunidades e pelos seus próprios méritos, mas outros chegarão bem perto ou descobrirão outra vocação relacionada ao serviço ao próximo.
O sonho não pode ser individualista, egoísta e soberba porque isto manifesta o desejo de sobrepor ao próximo, saciar a sede de poder, fama e luxo. Por consequência, surgem os regimes opressores movidos pela paixão do domínio sobre o próximo. Essa paixão individualista, fabricada na panela do inferno, divide pessoas e suscita disputa e morte.
Trago à memória o célebre discurso do pastor e ativista social Martin Luther King Jr que declarou: “eu tenho um sonho”. Aprendo que um sonho não se realiza nas câmaras da acomodação. Exige esforço, luta e sinergia. O sonho de transformação social se constrói lutando contra um sistema de pensamento dominante e contra uma ideia equivocada. A história comprova que não é tarefa facial e registra muitos mártires, incluindo o próprio o Cristo que pregava a “Grande Ideia de Deus” que contrastava com a doutrina dos religiosos e líderes políticos da época. Também, o pastor Martin Luther King morreu assassinado por alguém contrário o seu ideal de mundo igualitário para todas as raças e de diferentes posições sociais. Portanto, pode-se matar um homem, mas não pode matar as suas ideias.
Quero sonhar os sonhos de Deus com suas imagens que mostram as virtudes a serem adquiridas pelo ser humano. Essas imagens apontam para aspectos da minha vida que precisam ser melhorados, principalmente no relacionamento com o próximo. A vida é uma via de mão dupla na qual, se não obedecermos a sinalização, faremos vítimas: a nós mesmos e o próximo. Essa sinalização diz respeito ao amor ao próximo e a tolerância que devemos em relação aos mansos. A convivência pode ser agradável se soubermos conviver administrar bem os conflitos por meio do diálogo.
Gosto da forma como Nelson Mandela fala do Ministério da Verdade e da Reconciliação, criada quando era presidente da África do Sul. Segundo ele, era preciso a vítima acreditar na integridade do seu agressor para que ambos expressassem livremente os seus sentimentos e acontecesse a reconciliação. Dentre os relatos, diz que muitos agressores choraram e diziam que não sabiam que tinha feito tanto mal e suplicavam o perdão. Claro, há males que são irreparáveis e se esgotariam todos os recursos do mundo e, nesse caso, a privação da liberdade apenas atenua a sensação de injustiça. Por isto, a nova abordagem que ganha voga é a justiça restaurativa que leva a pessoa a reconhecer o seu erro, empenhar-se pela sua reparação e produz reconciliação com a sua vitima. Ou seja, produz recuperação do indivíduo para não torná-lo um transgressor contumaz e devolvê-lo restaurado à sociedade.
Apesar da convulsão social e a degeneração dos lares, continuo tendo esperança na instituição família. Acredito que o melhor investimento de governo deve ser dirigido às famílias, pois esta é a celular mater da sociedade. A degeneração da sociedade começa com o conflito conjugal que atinge a família como um todo. A perda da referência moral causada pelo desgaste da relação familiar coloca crianças e adolescentes a mercê dos ventos da impiedade, trazendo conseqüências para toda a sociedade. Penso que o problema deve ser atacado na sua raiz e não ser apenas remediado por famigerados programas sociais. O problema reside na falta de esperança e de perspectiva de vida das pessoas a começar no seio das famílias.
Mesmo com as dificuldades de hoje e amanhã, continuo firme na fé de que um dia a terra será restaurada da ruína que lhe consome. A terra está banhada do sangue das vítimas das guerras e da violência, produzida pela má índole, pela ganância dos homens e pela disputa de poder. Ainda, hoje inocentes e culpados são levados aos antros da morte. A insegurança campeia ao nosso redor e sinaliza que podemos ser a próxima vítima. Mesmo assim, acredito na justiça eterna da retribuição a cada um segundo as suas obras quer tenha feito o bem ou mal. Por isto, creio que o cálice da impiedade será dado aos homens e para os justos brilhará o Sol da Justiça.
CONCLUSÃO
A esperança é o balsamo para a alma ferida. É um rio no deserto da vida, irrigando as raízes da árvore da existência. É a porta que se abre quando as possibilidades falham. Às vezes o esforço humano torna-se insuficiente, sendo necessária a esperança para acreditar que há uma saída. Por isto, quem vive de esperança é mais que um sonhador. É um precursor de boas notícias de consolação para aqueles que estão aflitos e amargurados com a consolação na qual foram consolados.
REFERÊNCIAS
Não vou indicar referências, mas vou recomendar que leiam alguma obra biográfica da vida da Martin Luther King Jr.
Nenhum comentário:
Postar um comentário