
Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUÇÃO
Chegamos ao final do ano de 2010, quando se renovam os votos de um novo ano feliz e próspero. Os anseios do novo ano devem inspirar atitudes tal como a poesia acalenta o espírito, alegra a alma e transmite ao corpo sensação de bem-estar. Mas, não se deve procrastinar mais uma vez a realização da mudança de atitude, restringindo-se as promessas de fazer tudo diferente no próximo ano.
Certa vez, o filósofo, educador e teólogo Mario Sergio Cortella recomendou que, ao final do ano, cada pessoa pode escrever em um quadro os comportamentos que resultaram em erros ou desastres, em outro quadro as situações positivas e no último quadro as decisões a serem tomadas no novo ano e suas expectativas. Claro que isto é um exercício reflexivo em busca de uma tomada de consciência, evitando o precipitar de uma declaração “foi um ano ruim” ou “um ano muito bom”. Trata-se de uma forma de livrar-se do sentimento de culpa dos insucessos do ano e renovar os sonhos no próximo ano.
A beleza da alva que surge no primeiro dia do ano não deve ser contemplada com a ressaca explosiva, causada pelos excessos dos embalos das comemorações, pois, a programação de mais um ano deve começar nas primeiras horas do dia.
A partir dessas premissas, formulei algumas teses com base em experiência própria, adquirida pelo aprendizado da escuta e pelas tentativas: ensaio erro x acerto. As teses referem ao planejamento, organização, evitar desperdício e cultivar relacionamentos.
A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO
Tenho sempre ressaltado que para não ser a próxima vítima do acaso deve haver planejamento. Quem planeja acredita que é perigoso esperar pelo acaso, pois suas decisões podem ser anuladas por força de situações alheias a sua vontade. Por isto, não acredita somente no empenho e na força de vontade; pensa que suas energias e pensamentos devem ser programados de acordo com os recursos, tempo disponíveis e oportunidade.
Trata-se da arte de visualizar o objetivo a ser alcançado; ver o resultado do produto acabado antes da sua elaboração; é definir o percurso para chegar a um determinado.
Por isto, uma das queixas de muitas pessoas é o endividamento, acusando o baixo salário. Porém, há várias razões para o endividamento: para alguns é causada por compras por impulso, Ou seja, uma válvula de escape para curar a ansiedade. Sim, há pessoas que buscam curar a irritabilidade, fazendo compras por impulso sem a devida necessidade. Depois, sentem-se culpadas com as contas a pagar; recorrendo a empréstimos para pagar contas e, mesmo assim, conseguem se livrar das dívidas. Considerando que isto é vício, essas pessoas vivem infelizes, inseguras e propensas ao eterno endividamento até se curarem dessa pulsão.
Outras pessoas buscam o alpinismo social e se sacrificam para se identificarem com determinados grupos. Assim, gastam além de suas economias para adquirirem certo status. Ou seja, buscam ostentar a falsa nobreza e a sensação de bem-estar.
Ao ler uma entrevista do humorista Chico Anysio, anotei algumas dicas de economia que ele recebeu da sua ex-mulher Zélia Cardoso de Mello. Segundo seu depoimento, ele aprendeu que a melhor forma de administrar os seus recursos é o pagar as contas em dinheiro, pois, desta forma, é fácil perceber a entrada e a saída do dinheiro. Assim, é possível exercer certo controle sobre o capital, evitando o desperdício.
Como conseqüência, passei a ter um planejamento mensal e anual das contas, privilegiando o pagamento a vista, evitando as armadilhas do cheque especial, do cheque pré-datado e do cartão de crédito. Assim, o planejamento passa ter como referência os recursos reais e não fictícios, observando-se que acumular cartões de diferentes bandeiras é uma estultícia própria daqueles que primam pela ostentação.
Cultivar o estilo simples sem estar preso aos ditames da moda e da novidade é uma sugestão inteligente. Há pessoas que são vorazes em comprar o último lançamento de celular, roupa sem calcular suas possibilidades com tiverem uma fonte inesgotável de recursos.
O planejamento não envolve só dinheiro. É possível planejar o tempo e a realização dos sonhos. O estilo de vida desregrado é pretexto para se chegar atrasado aos compromissos e cumprir os prazos prometidos. O planejamento possibilita que as coisas obedeçam a uma seqüência lógica de tempo, possibilitando o atendimento a demanda e a previdência dos percalços.
Quando alguém é uma personalidade suas demandas aumentam, tornando-se prejudicado o tempo e sua privacidade é interrompida por incessantes toques de celular. A disciplina é o remédio para que os contextos não se confundam: vida pessoal e profissional no seu devido lugar e momento. As necessidades têm pressa, mas as demandas podem ser programadas para ser encaminhadas no seu devido tempo, sem o stress do urgentíssimo. Aliás, o planejamento cancela todas as desculpas do urgente – urgentíssimo.
ORGANIZAR AS PRIORIDADES A PARTIR DO QUE É ESSENCIAL
Umas das passagens veneráveis do livro do profeta Isaías capítulo 55, versículo 2 recomenda a administração financeira por prioridade, citando a alimentação. Aliás, muitas parábolas, citadas nos Evangelhos, tratam direta e indiretamente de administração financeira como, por exemplo: a parábola dos talentos, da minas, do fermento, da semente, etc. São temas que abordam matéria prima, investimento e lucro. Assim, vão contra a mentalidade pedante de se prender ao acaso, sem os recursos do esforço da inteligência e da engenharia administrativa e da oportunidade.
A vida deve se organizar a partir de prioridades: aquilo que é essencial, depois o que é necessário, partindo para o que é importante e o interessante.
O essencial está relacionado à matéria-prima das necessidades. Está relacionado à aspiração da vida que se constrói no dia-a-dia: a alimentação, o vestuário e a habitação. Definir o que é essencial é identificar a dignidade da pessoa; é ver que sem o atendimento a essas necessidades o homem está condenado à indigência.
Depois, supridas as carências do essencial pode-se buscar o que é necessário: a educação, por exemplo. O bom emprego é proporcional ao valor do diploma, do mérito e da oportunidade. Pelo estudo sistemático chega-se a universidade e obtém-se o diploma, porém isto não é tudo. Deve-se provar o conhecimento adquirido e abraçar as oportunidades que surgirem. Deixar passar as oportunidades é esquecer de acordar para viver o sonho. Por isto, o necessário valoriza o essencial e possibilita buscar o que é importante e interessante.
As necessidades humanas não se esgotam, porque o homem não quer apenas viver, quer viver bem e com conforto. Assim, o essencial ganha sofisticação e passa a significar “luxo”.
Organizar as prioridades a partir do essencial é reconhecer seus próprios limites. Viver cada momento a seu tempo sem arroubos de soberba e esnobismo. É aguardar a sua vez na história, sem pressa pois cada momento é propício para ser feliz.
EVITAR O DESPERDÍCIO
É preciso reconhecer que a nossa vida é feita de valores que não podem ser desperdiçados. A dignidade construída no labor histórico de dificuldades não pode ser banalizada por um momento de prazer. Desta forma, muitos têm traspassado a sua alma e provado o sabor da morte.
Por isto, toda a energia de uma vida não deve ser apagada em um momento, quando as dores chegarem cobrando o salário do uso indevido das drogas: álcool, cigarro, barbitúricos e substâncias tóxicas diversas. A energia se esgota quando a natureza do corpo é maltratada por noites perdidas, má alimentação e toda forma de excessos. A vida é um bem raro que não deve ser desperdiçada. Sim, deve ser vivida com cuidado e poesia.
A mente deve ser povoada de bons pensamentos, sem as pragas daninhas trazidas pelo mau uso da internet, da televisão e de certas literaturas. A leitura de um bom livro traz conhecimento e ilumina a alma, libertando-a da ignorância. Por isto, concordo com Myles Munroe quando diz que comprar livros é mais importante do que comprar comida. Ou seja, a comida demora seis horas no organismo, mas o conhecimento dura toda vida.
Valorizar o produto do seu trabalho é evitar o desperdício das sobras de alimentos, compras de roupas que não se vai usar, produtos encalhados no canto da casa. Convém lembrar de um pensamento anônimo: “onde há sobra tem desperdício; onde há fartura tem falta, pois quando todos se alimentam e se fartam não há falta”. “Ou seja, enquanto comidas aqui são jogadas fora em outros lugares pobres há gente passando fome”. Reflita.
CULTIVAR RELACIONAMENTO
O homem é um ser de origem gregária. Ou seja, não consegue viver sozinho sem cultivar relacionamento. Contudo, vivemos em comunidade marcada pela diversidade em todos os sentidos e essas diferenças nos forçam ao diálogo pelo entendimento do outro, sua força de pensar, de ser e agir.
É possível que eu seja conhecido de muitos, mas, alguns deles, escolhi para serem meus amigos. Por quê. Pela aproximação descobri a afinidade, traços comuns e a inspiração. A definição para amizade dada por Mike Murdock é interessante: “a amizade é uma forma de premiar a lealdade e a confiança”. Bem sei que nem todas as pessoas conhecidas são minhas amigas apesar dos bons valores que cultivam e a idoneidade que possuem, pois é uma questão de escolha pessoal. Contudo, a universalidade do respeito à pessoa prevalece na relação entre conhecidos e amigos.
A relação cordial, afetuosa e sincera no trabalho, na igreja e em outras instituições é uma necessidade lógica. É salutar vivenciar relações duradouras, comunicando parcerias e exercendo a tolerância recíproca.
Assim, cultivar relacionamentos no novo ano é salutar para perceber que paz é comunhão e não isolamento, que a felicidade é para ser compartilhada sem constrangimentos e que a vida se frutifica quando nos aproximamos uns dos outros de forma fraterna.
CONCLUSÃO
Viver o próximo ano é um desafio a ser enfrentado com receitas antigas, mas com novas atitudes. Por isto, o planejamento deve estar associado a organização em todos os sentidos, evitando o desperdício e cultivando relacionamentos.
REFERÊNCIAS:
Sugiro a ver a serie de TV: Filosofia, um guia para a felicidade. Apresentada por Alain de Botton no canal da TV Escola.