MINHAS TRÊS MÁXIMAS
Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUÇÃO
Há tempos venho divulgando junto aos amigos algumas ideias que, por sinal, traduzem o senso de responsabilidade com as palavras. Concordo com o educador Rubem Alves (2005) que as palavras grudam em nós se fosse uma tatuagem e se tornam irremovíveis, sendo adicionadas novas pinturas de palavras a cada momento. Por isto, tenho que o exercício da reflexão proporciona mais consciência dessa realidade, evitando os tropeços mais comuns da palavra.
Para evitar o inesperado, forço o exercício do pensamento até as últimas conseqüências na tentativa obter a consistência lógica, avaliando a coerência, a pertinência e a oportunidade. A coerência é uma alternativa para fugir do contraditório, tornando as idéias e os procedimentos lineares. Isto possibilita uma visão límpida das atitudes e, mesmo que não agrade a todos, a coerência será sempre louvada, pois é mais importante ser autêntico do que politicamente correto.
No exercício do pensamento, considero a pertinência das palavras para além do ponto de vista da aceitação geral. Claro, as palavras devem ser orientadas por um fundamento e um objetivo altruísta a ser alcançado. Doutro modo, prevalecerão sempre interesses mesquinhos de satisfação do próprio ego e de esnobismo ao próximo.
A oportunidade determina a exatidão do tempo: não ser adiantado nem atrasado em comunicar suas necessidades e interesses. Claro, há sempre um clamor pela resposta imediata a uma provocação, amparado no pressuposto da retaliação, pois a agressão em palavras é celebrada como uma intimidação e imposição de respeito.
Diante dessa constatação, construí três máximas para explicar que as minhas palavras estão relacionadas a um contexto reflexivo e subliminar, trazendo no encoberto uma verdade.
PRIMEIRA MÁXIMA: TODAS AS MINHAS BRINCADEIRAS TÊM UM LADO SÉRIO
Ao considerar a seriedade da brincadeira, invoco a responsabilidade da mensagem subliminar que está presente nas piadas, ironias e imitações. Claro, brincadeiras podem encobrir preconceitos, repulsa, esnobismos, podendo ser interpretado como um ato de covardia. Por outro lado, ter consciência da seriedade da brincadeira impõe o bom senso para traduzir nas pessoas o afeto e o respeito. Por isto, busco a disciplina para evitar mensagens subliminares que agrida o próximo.
Costumo dizer que as brincadeiras são recursos lúdicos para entreter pessoas, realçando suas qualidades e possibilidades. Mas, raramente, revelo a alguém a mensagem subliminar de uma metáfora ou ironia que venho a proferir. Aliás, gosto de convidar as pessoas à reflexão sobre a vida, suas motivações e celebrar a amizade.
Outra motivação para a brincadeira é desconstruir sentimento de tristeza e de preocupação e tirar pessoas da meditação dos seus problemas. A realidade hipnótica da crueza da vida deve ser reduzida ao pó, pela serenidade do consolo lúdico. Aliás, a brincadeira pode ser mediação para atenuar dores e trazer pessoas para uma órbita de serenidade, mesmo que isto seja temporário.
Também, quebrar a frieza das relações formais pode contribuir para o estabelecimento a relacionamentos mais estreitos e a construção de confiança e amabilidade, desde que a brincadeira seja um ato comprometido com o bem-estar do próximo.
SEGUNDA MÁXIMA: ESTOU SEMPRE REPETINDO AS MESMAS PALAVRAS
As minhas palavras são de repetição contínua, pois refletem ensaio de um pensamento construído nos momentos de solidão. Aliás, é mais cômodo repetir as mesmas palavras, mesmo que de forma diferente, pois se constitui um argumento muito forte de que nada não é inédito. Quando as palavras não são inéditas, cria-se instrumentos para análise da coerência e conseqüências. Assim, as palavras ganham intimidade e personalidade própria. Ou seja, é uma tatuagem que acompanha a pessoa em diferentes lugares.
Por isto, quando alguém argumenta o teor das minhas palavras, tenho o álibi da repetição como mecanismo de defesa. Assim, permito-me relacionar as palavras a cada contexto e aplicá-las conforme a necessidade, mesmo que aconteça a confrontação de idéias. Para tanto, as palavras passam por leituras e releituras quanto a aplicabilidade de contextos.
Gosto de dialogar com amigos, debruçando sobre a especulação teórica e filosófica de diferentes assuntos. A repetição exaustiva de teses contaminou meus amigos próximos que, também, passaram a reproduzi-las de forma repetitiva. Assim, persisto em dizer as mesmas coisas, consciente de que novos significados são constituídos pela reflexão contínua, possibilitando o surgimento de novas teses.
TERCEIRA MÁXIMA: A MINHA FALA É AUTOBIOGRÁFICA – SEMPRE ESTOU FALANDO DE MIM MESMO
Acredito na relação afetiva de cada pessoa com as palavras, pois as palavras traduzem a existência do individuo: sua experiência, aquilo que ele gosta ou não, em si mesmo ou nos outros. Assim, partir do eixo do meu próprio corpo e do ego para me comunicar, dizendo sempre na primeira pessoa do singular ou plural. Até quando digo “Eles”, estou enquadrado na historicidade do contexto.
Cada palavra está carregada de historicidade, personalidade e vários sentimentos: alegria, tristeza, raiva, frustração e outros. Também, a arte de comunicar com as palavras envolvem gestos, expressões da face, respiração e tonalidade de voz. Logo, me relaciono não somente com as pessoas, mas com as palavras.
Ao elogiar alguém estou revelando atitudes, comportamentos pelos quais me identifico e gostaria de participar afetivamente. Ou seja, é uma apreciação pessoal, oriunda da observação sistemática e identificação moral. Claro, todos nós estamos impregnados de julgamentos morais em relação a si mesmos e ao outros.
Quando critico, estou revelando comportamentos pelos quais não me identifico e gostaria de evitar. Falo de coisas que ofendem a minha identidade. Ou seja, comportamentos que não gostaria de copiar. Trata-se de exemplo que não gostaria de evitar ou algo que me aflige.
Logo, minha fala é autobiográfica, pois não consigo fugir da minha história que é contada nas mensagens subliminares das palavras. Eu sempre estou falando de mim mesmo, utilizando código e me comprazo em expelir experiências para as pessoas não verem, não ouvirem, apenas sentirem. A tradução das mensagens subliminares é privilégios de poucos.
CONCLUSÃO
Vivo intensamente cada dia, com a consciência de que as palavras são punhais nas mãos das pessoas. Alguém pode ouvir uma mensagem e transformá-las em potenciais incentivos enquanto outras podem interpretar as mesmas palavras como críticas.
A relação passional com as palavras é inevitável. A dica é comunicar sempre: o mal-entendido sempre haverá para complicar as relações humanas.
REFERÊNCIAS
Recomendo a leitura dos livros:
ALVES, Rubem. Um céu numa flor silvestre. Campinas (SP): Versus Editora, 2005.
CHALITA, Gabriel. Educação: a solução está no afeto. São Paulo: Editora Gente, 2001.