sábado, 24 de dezembro de 2011

TRAZEMOS NOS OLHOS




Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUCÃO
Há algum tempo venho compartilhando ideias em rodas de conversas com amigos sobre assuntos de natureza moral, alguns princípios e especulações teóricas. Nessas conversas surgia sempre a indignação com o mal feito, a injustiça e as posturas equivocadas. Ficava escandalizado como muitas pessoas, algumas delas declaradamente religiosas, faziam o caminho inverso do desvendamento da luz da existência, impondo a ideologia da interdição do corpo com uma política mesquinha, tapando a boca do poço da verdade para os sedentos.
Parece que quando a oportunidade de a verdade ser desvendada sempre surge algum fato novo para desviar a atenção e encobri-la por mais um tempo. Enquanto isto, alguns loucos dialogam sozinhos suas inquietações e, quando falam, ficam na expectativa de serem silenciados. Aliás, protestar contra o erro incomoda os reis em seus palácios, pois a eminência de qualquer revolta ameaça a perda dos seus privilégios.
A voz dos loucos algumas vezes caminha contramão da lógica daqueles que exercem o domínio. É a voz do oprimido, do insatisfeito com a tragédia do caminho tortuoso e dos erros dos poderosos. Ainda, assim, a propaganda da eficiência e da culpa é estratégica mais adotada para engabelar os insensatos e encobrir seus deslizes. A intenção se perpetuar no poder e sobreviver lutando contra todos os adversários até a última gota. Não sabe que aqueles que resistem se alimentam das fraquezas para anunciar a necessidade de mudança.
A LUZ DOS OLHOS E O NATAL
Parece que o Natal é o pretexto para silenciar todos os argumentos da contradição e para a apresentação dos anúncios de paz, alegria e fraternidade. Nessa época, até os excluídos recebem presentes pressupostamente atribuídos a Papai Noel e os que passam fome recebem cestas básicas e de Natal. Destaca-se o refrão de que todos tenham um “Feliz Natal”, mesmo que seja apenas um dia no ano. É nesse momento que se lembra dos orfanatos, dos asilos, das favelas, dos miseráveis do sertão, etc. Contudo, o princípio do Natal deveria ser manifesto todos os dias do ano na vida das pessoas e não apenas nas celebrações do Natal.
Por isto, trazemos nos olhos neste Natal a expectativa de que nasça uma nova consciência entre os homens. Que a solidariedade não seja uma coerção cultural festiva, mas um ato de transformação moral e social. Do contrário, tudo volta a mesmice do individualismo canibalesco que se alimenta da exploração do próximo.
A mesma mensagem do Natal se repete há tempos, mas os valores vão se deformando ao longo dos anos, os conceitos de famílias se evaporam como naftalina nos armários e a educação dos filhos é terceirizada à mídia, aos grupos de amigos e à escola. Mas, no Natal, a família se reúne para celebrar a fartura da ceia com os excessos de comida e bebida alcoólica. A alegria efêmera é celebrada com um punhado de tradição, sem nenhuma reflexão teológica que o dia de Natal exige.
O Natal do Papai Noel faz a alegria do capitalismo, movimenta a indústria e comércio deste país e do mundo. O Natal comercial desvirtua a comemoração do nascimento Cristo do Cristianismo. Esse Natal é cheio de luzes, com presépios iluminados e custos elevados para os municípios – valor tão alto que poderia cobrir despesas com educação, saúde e/ou de outra área social. Mas que pena! Somos traídos pelos órgãos dos sentidos, a começar pela visão e a beleza que fascina é a nossa ilusão. Nem tudo que vimos é real por mais belo que seja. É uma cortina que nos veda o acesso a realidade dos fatos. A verdade está atrás da cortina ou como diz o escritor de Cantares está atrás dos nossos muros. Por isto que a candeia do corpo são olhos e os nossos olhos precisam ser bons para que o nosso corpo seja iluminado. Do contrário, seremos domesticados e orientados pelas viseiras da ideologia dominante.
As luzes e as celebrações deveriam mover as batidas do coração e abrir os olhos da alma. Porém, as lanternas do capitalismo só permitem ver troca de presentes, comidas e bebidas das ceias de Natal. Além disto, o Papai Noel torna-se o centro das atenções das crianças e dos adultos, pois o velhinho é um ídolo cultivado desde a antiguidade como símbolo do Natal. No lugar do presépio surge a árvore de Natal e os presentes em que cada um presenteia aos membros do ciclo de amizade.
Nosso olhar sobre o Natal não deveria ser mercantilista, amparado na tradição dos excessos. Esses excessos de comida, de bebidas e de despesas supérfluas que geram em muitos o endividamento. Nesse caso, as compras são realizadas porimpulso como meio de satisfação pessoal e social ou até mesmo ostentação.  
No advento de cada Natal fala-se muito em paz, solidariedade e justiça, mas, no decorrer do ano, tudo não passa de votos não cumpridos e esquecidos na masmorra das consciências. Trata-se da repetição de um ciclo de posturas viciadas e alienantes em que cada um devora o seu próximo como se fosse um manual de sobrevivência na selva, onde os mais fortes suplantam os mais fracos.
Convido a refletir com o filósofo Mario Sérgio Cortella sobre o Natal. Ele mostra que o Natal deve levar as pessoas sobre a importância do nascimento de Jesus e o que Ele significa para a história da Humanidade, como o seu ensino tem relação com a nossa vida e a fé que inaugura. A reflexão exige o silêncio, a pausa e até a mesmo a melancolia. Faz a pessoa se desligar do mundo e viajar para dentro de si mesma e verificar se a vida, ações e relações condizem com os princípios anunciados por Cristo. Também, a reflexão pode ser celebrada junto em família desde que a palavra “comemorar” signifique “lembrar juntos” com a família, os amigos etc. Claro, não existe Natal sem Cristo, assim como não existe Cristianismo sem Cristo. O Natal sem Cristo é uma tradição sem vida, extemporânea e midiática.  
CONCLUSÃO
Sou uma das pessoas que no Natal quero celebrar a encarnação do Verbo Divino, o significado da habitação de Deus entre os homens, seu propósito e essência. A vida não precisa ter trevas. Há a luz de uma estrela que brilhou no primeiro Natal e irradia sua doutrina no mundo. A palavra de Cristo é luz transformadora de vidas desde que a pessoa ande como Ele andou.
REFERÊNCIAS
Recomendo a leitura dos textos do filósofo Mario Sérgio Cortella sobre o Natal, principalmente pela experiência religiosa e seus escritos enquanto teólogo.

sábado, 10 de dezembro de 2011

APENAS A VERDADE – PARTE 2


Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUCÃO
No último artigo refleti sobre a verdade como princípio ético e moral, porém ficaram algumas omissões importantes e a algumas perguntas não respondidas, tais como: por que o mal campeia triunfante durante longo tempo, causando tanto dano, fazendo as pessoas desacreditarem da bondade, da justiça e da verdade.
Percebi que realmente a mentira continua produzindo danos incalculáveis e que há inúmeros exemplos ao longo da história e do cotidiano: de pessoas que foram mortas por causa de uma mentira, casamentos desfeitos, guerras, etc. Restaram como despojo a mágoa, o ressentimento e a vingança, pois, a vida perdida não voltará mais e o belo castelo construído desmanchou-se apenas com uma palavra. Assim, o desafio de perdoar a afronta de alguém tem o peso de uma montanha para ser transportada, porque é algo que mexe nas cicatrizes da alma, com o orgulho ferido. Mas, manter a mágoa alarga a ferida, deprime, adoece a alma, envelhece os ossos e produz morte.
QUANDO A VERDADE FALTA
Vivemos a geração das terapias e dos antidepressivos, pois a cada dia aumenta o número de vítimas do trânsito, de assaltos, homicídios, fatalidades e outras tragédias. Apesar das proibições e das penalidades legais, persistem as irresponsabilidades de pessoas alcoolizadas, usuários de drogas e delinqüentes. Mesmo assim, há quem defenda que os infratores também são vítimas e culpa a sociedade, a família e o Estado por todos os males. Nessa lógica, a marginalidade seria forma de retaliação do indivíduo excluído socialmente à agressão simbólica que sofreram e, nessa desculpa, atenua-se a culpa dos inconseqüentes.
Percebo que a corrente humanista aparenta ser menos complacente com as vítimas da violência e institucionaliza a lógica da desforra na sociedade. Nesse caso, o adolescente se torna infrator porque sua família é desajustada, o mauricinho se torna usuário de drogas e marginal por causa do enfado da vida de luxo e da família permissiva, alguém matou porque sofreu violenta emoção do ciúme e, assim, cresce a enumeração das desculpas. Espera-se que alguém tenha a dignidade de assumir seus erros, tirando a máscara da presunção de inocência, amparado na demência do ato jurídico.
A impunidade se legitima pela mentira produzida por hábeis advogados, pagos a preços de ouro. Os subterfúgios do poder econômico são usados para afrouxar a lei e o juízo. Essa opressão sobre o fraco e o pobre tem suas desculpas: o Código Penal Brasileiro está ultrapassado e precisa ser mudado. E por que não muda? Porque, entre os que fazem a lei, há quem dela se beneficie por estar respondendo a processos de improbidade administrativa, grilagem, evasão de divisas, formação de quadrilha e outros crimes, cujos processos são postergados por caros advogados. Enquanto isto, acontecem manifestações, clamores por justiça e multiplicam-se as desculpas por meio de transferências de responsabilidades e, no final, a culpa recai sobre a sociedade por ser pressupostamente omissa, ignorante e por não saber escolher os seus representantes nos centros decisórios de poder. Daí surge nova desculpa é preciso investir mais em educação e por que isto não acontece?
Ninguém pode negar que a mentira é uma ideia. Também, não se pode negar que uma ideia é construção lógica de uma forma de pensar com certa coerência, pois envolve todos os processos mentais: aplicação, encadeamento, associação, relacionamento e outros. Quando uma ideia é multiplicada, repetida ao maior número de pessoas com forte argumentação, ela tende a se parecer com a verdade. Mas não é o número de adeptos ou seguidores a evidência que alguém está dizendo a verdade. A verdade nunca será instrumento de dominação, de manipulação, de lavagem cerebral. Quem é verdadeiro inspira as pessoas e não as manipula. O que caracteriza a mentira é a lógica da trapaça, a rede de subterfúgios, o pressuposto do levante, a consciência do mal e do engano. É uma cegueira imposta por uma venda a alguém para seguir caminhos tortuosos cujo fim é a morte.
Acerca do engano, lembro das palavras do divino Mestre: “fiquem espertos para que ninguém vos engane porque surgirão muitos enganadores, vestidos de pregadores da verdade”. Outra vez, ele avisou que os enganadores são soberbos, ingratos, violentos, gananciosos, avarentos, sem afeto natural e aproveitadores, mesmo investidos da aparência de piedade. Assim, o que te protegerá do engano é buscar o conhecimento da verdade, pois ele produz sabedoria, a capacidade de discernimento do que é verdadeiro e falso.
Devido à multiplicação do mal, devemos estar vigilantes para não sermos a próxima vítima. Por quê? Uma rede de mentiras provoca cegueira tal que foge até do senso racional. A pessoa fica convencida que o engano é verdadeiro, podendo tornar-se agressiva com quem quer convencê-la do contrário. Daí surge a alienação porque a pessoa passa ter um estilo de vida equivocado.
A doutrina da verdade relativa pressupõe a relativização da mentira. Ou seja, há várias verdades; logo a mentira depende do ponto de vista de cada um. Todos possuem a sua própria verdade e todos têm a sua razão. Trata-se da abolição da mentira, da deslealdade, do pecado e do crime para surgimento de neologismos como “erros”, “equívocos”, “irregularidades” e “posições de cada um”. Assim, aprisiona-se a verdade ao sabor das conveniências, esvaziando-a do arbítrio ético e moral.
Hoje temos convivência com várias ideologias. Não se trata apenas de um conjunto de ideias voando nos ares e nos livros. Segundo Pedro Demo, ideologia é a justificativa de nossas posições políticas. Nisto surgem várias bandeiras, rótulos e estigmas: direita, centro e esquerda, conservador e liberal, etc. e essa segmentação não se reflete em diversidade de pensamento, mas em conflitos e disputa de poder. Assim, cada um bandeia para sua ideologia e faz dela seu sistema de crenças, lutando para perpetuá-la como verdade. Por consequência, passa a constituir a sua verdade e todas as pessoas passam a serem julgadas pelo crivo de seu pensamento, tornando-se uma trave a ser rompida pela confrontação com a verdade suprema. A verdade suprema é a luz que torna visível todas as coisas; revela o escondido e dá entendimento aos símplices.
Entendo que as ideologias produzem o enfrentamento, sendo a razão de muitas guerras ao longo da história da humanidade. Aliás, as ideologias deveriam conduzir a dialética para, por meio do diálogo e da negociação, produzir a síntese e o consenso. Mas, historicamente tem sido fonte de acirramento das vaidades, pois cada um agarra a sua verdade como único fio de esperança ou tabula de salvação, impondo sua forma de pensar até as últimas conseqüências.
Há quem acredita que pensar diferente é uma forma de oposição e parte desse pressuposto para silenciar as divergências e, ao dar conotação pessoal, cria adversários e tenta eliminá-los. A solução não é ver a ideologia como algo inerentemente mal, mas como uma ferramenta para a leitura do mundo, entender a diversidade existente nesse imenso universo e o exercício da tolerância com liberdade de cada um expressar a sua opinião. Expressar as palavras como um palpite na roda de amigos, sugerido pelo educador Rubem Alves, é meio mais eficaz para aprender a exercer essa tolerância de conviver na arena do debate divergente.
Uma questão importante que aprendo nos escritos de Max Lucado é que a verdade suplanta o medo. Esse medo irracional do desconhecido, do amanhã, do contraditório, de nossas expectativas serem frustradas, que nossas provisões faltem e, sobretudo, que nosso ciclo de existência seja interrompido a qualquer momento. Por isto, entendo porque a palavra divina mais pronunciada é: “Não temas”. Claro, nós nos alimentamos dos nossos medos, nos escondemos nos seus casulos e fazemos deles nosso escudo, nossa arma. A nossa irracionalidade tem sua fonte no medo. Por medo, agimos com violência com o próximo com a estratégia de um ataque preventivo, para impor o respeito e não sermos incomodados na sala de estar do nosso ego e da auto-suficiência.

CONCLUSÃO
Ainda, sobre o medo, vejo que o temor deve ser o termômetro da nossa ansiedade e não instrumento da insanidade do pânico. Há pessoas que se enclausuram nas síndromes para justificar seus temores. Mas a verdade afasta o medo, investe a pessoa da autoridade da fé e da esperança, que nos liberta da ditadura dos órgãos do sentido. A esperança nos faz ver o futuro no presente, dando-nos segurança nos nossos ideais; a fé nos faz acreditar que tudo é possível e nos dá o combustível para batalhar para realização dos sonhos.
REFERÊNCIAS:
ALVES, Rubem. O céu numa flor silvestre: a beleza em todas as coisas. São Paulo: Versus Editora, 2008.
DEMO, Pedro. Introdução à Metodologia da Ciência. 2ª Edição. São Paulo: Atlas, 1987.
FINLEY, Mark. Tempo de Esperança. Tradução de Cecília Eller Nascimento. Tatuí (SP), Casa Publicadora Brasileira, 2009.
LUCADO, Max. Sem Medo de Viver. Tradução de Bárbara Coutinho e Leonardo Barroso. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2009.

sábado, 26 de novembro de 2011

APENAS A VERDADE

 
Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUCÃO
As vozes quebram o silêncio para rasgar os ares com o desabafo, liberando do peito todo o sentimento reprimido da tristeza e das mágoas sentidas. A estratégia para transformar a aflição em palavras é uma batalha emocional sem precedentes na invisibilidade da ação/reflexão de cada indivíduo. Surge, então, a busca de argumentos para fundamentar a razão com o intuito de eliminar o contraditório, pois o reclamante quer se tornar senhor da verdade acima dos enganos e desenganos. O ardor do peito e do olhar são mensagens silenciosas em códigos indecifráveis e tem significado exclusivamente pessoal. Aliás, na solidão, toda pessoa faz um diálogo consigo, ensaiando as palavras e as situações na expectativa de lograr êxito no duelo da razão. 
A CONCEPÇÃO DA VERDADE
O duelo da razão reclama pelo julgamento da verdade e da mentira em um debate acalorado. Como em uma luta de boxe, espera-se que o debate de ataque e defesa termina quando um dos oponentes vá à lona pela humilhação e o desmaracamento. Porém, glória do embate é ilusória, pois quem vence a discussão não sente totalmente vencedor e quem perde não reconhece a vitória do adversário, persistindo as mágoas e os ressentimentos. O final trágico do duelo de palavras traz no seu despojo o término de uma bela amizade e a dívida do perdão. Afinal, não há julgamento digno no cenário de ânimos exaltados, com pessoas embriagadas pelo ódio e pelo ressentimento, pois todos estão errados.
O caminho do perdão é plausível, quando se reconhece a integridade do outro e não se coloca na condição de vítima, mas também como causador do conflito. No processo de perdoar mutuamente são resolvidos os mal entendidos e inaugura-se nova fase de disciplina nas relações, pois a experiência do conflito gera conhecimento e respeito a personalidade do outro.
Certa vez, ouvir alguém dizer que existem três versões da verdade: a minha verdade, a verdade do outro e a verdade verdadeira. O pensamento humanista e jurídico convencionou que é preciso ouvir todas as vozes para extrair a verdade verdadeira. Assim, a verdade seria produto de uma hermenêutica e exegese, síntese da somatória das contradições e consensos. Contudo, essa verdade é uma decisão imposta e não reina soberana sobre todos.
Quando a mim, dirigirei a Deus a minha fala quando o coração sangrar e a lágrima como explosão inconseqüente ao mar dos infortúnios externar como uma gota ardente. Não reclamarei as minhas razões como verdade, mas procurarei os desertos e os montes da alma para, na solidão dos meus pensamentos, represar todas as sensações de tristeza, autocomiseração ou até mesmo de vingança. Claro, todas as nossas concepções de justiça são temerárias e até mesmo passionais. Vai à mão do ministério da injustiça, operada pelos agentes da iniqüidade, com a complacência das bênçãos da legalidade. Por isto, na fragilidade da carne, folgo na busca da autodisciplina, procurando entender as emoções, interpretando-as dentro do princípio das virtudes mais excelentes do cristianismo.
Verbalizar o sentimento da ira, respeitando a dignidade do próximo é desafio do autocontrole. Assim sendo, amo o silêncio dos meus pensamentos para que a brandura se estabeleça. Até o desabafo é seletivo, pois contar os segredos depende da cumplicidade, da lealdade e da confiança. A sensação da verdade é ilusória quando ela se apóia nas expectativas frustradas, quando se ignora todas as possibilidades e quando o nosso desenho de perfeição vem desmoronar diante dos nossos olhos.
Há quem pensa que a verdade é um instrumento de constrangimentos, intimidação, chantagem e vingança, utilizado ao sabor das conveniências. A verdade nunca será instrumento da iniqüidade, nem arma violenta para destruir pessoas. Sua utilização é contra o mal, a mentira, o engano e a trapaça. Ou seja, tem por objetivo a correção, estabelecer a justiça e a equidade entre os homens. Logo, a verdade não se compraz com interesses mesquinhos, vaidade pessoal e autopromoção.
Uma das ilustrações mais evidente é que a verdade é luz, pois ela revela as coisas escondidas, os segredos dos conluios e a escuridão da ignorância dos incautos. Aliás, há situações que pensamos serem coerentes, lógicas e sensatas, mas um dia a verdade revelará as intenções dos corações e a realidade dos fatos sem maquiagem. Assim, a verdade é a expressão da liberdade das algemas da ignorância, razão porque o cânon divino julga que o povo perece por falta do conhecimento. Não me refiro ao saber acadêmico, pois a academia exalta o humanismo ao extremo, reforçando a estratificação social de classes, inserindo a lógica da competição por melhores empregos, condições de vida, etc. A verdade que apregoo conduz ao autoconhecimento, à compreensão do propósito da existência. Nesse sentido, passamos a entender o significado das palavras a começar pela oração do “Pai Nosso”, cuja pretensão foi ensinar os homens a não serem egoístas. Ou seja, Deus é meu, teu e o nosso Pai.
Fico pensando no poder de transformação da palavra da verdade quando dita no momento oportuno. A sabedoria e a verdade são irmãs gêmeas, devido a sua origem comum e as palavras certas ditas no momento certo são como maçãs de ouro em salvas de prata. Dizer a verdade é um exercício de sabedoria porque o gênero humano é mal em sua essência, carecendo da disciplina desde a tenra idade. Assim, não basta dizer a verdade é preciso vivê-la, pois o ensino sem exemplo é como uma cidade sem muros. Viver a verdade implica ter uma vida sob disciplina no pensar, no falar e no agir, pois o homem que não domina o seu próprio espírito é uma bomba pronta a ser detonada a qualquer momento contra si mesmo e o próximo.
Há pessoas que já estão acostumadas a viver na mentira, por isto, valorizam a trapaça e a quebra de regras. Ainda, não satisfeitas criticam outras pessoas e, principalmente, os políticos. Mas, no dia-a-dia cometem pequenas desonestidades e o suborno para encobrir seus erros. Fica a sensação de que a minoria dos homens e mulheres de bem se sentem acuada diante do império da iniqüidade, operada por um Estado que comete injustiça e subverte os valores, sob a benção da legalidade. Nesse caso, até a educação familiar fica prejudicada. Essa contradição da sociedade é legitimada por agentes do Estado, pois a política e a justiça é operada pela supremacia das classes dominantes. Consequentemente, o argumento de que “todo mundo faz” é aceito. Por isto, as pessoas silenciam e consideram normal quando o populacho saqueia uma carga de mercadorias, após um acidente de trânsito como se a verdade fosse uma condição imposta por ampla maioria, mesmo visível o aspecto da honestidade.
A verdade não é estabelecida pela força, mas pelo convencimento e as pessoas podem aceitá-la ou não. Claro, a revelação da verdade provoca tristeza, consternação, desequilíbrio nas estruturas de pensamento e mudança em estilo de vida. Por isto, algumas pessoas preferem adiar a revelação da verdade, mesmo sabendo que agressões morais são praticadas por pecadores contumazes contra esposas, maridos e filhos. Esperam que a verdade ilusória dure um pouco mais e ficam na expectativa de assistir na platéia a previsível tragédia do castelo da felicidade do outro desmoronar. Contudo, a verdade triunfa porque ela se sobrepõe a própria história e aos remendos da mentira. Aliás, a mentira precisa de outra mentira para sobreviver e tentar encobrir a verdade até o dia que tropeçe em suas próprias pernas e a verdade venha à tona.
É mentira dizer que nem todas as pessoas estão prontas para ouvir a verdade, com se ela fosse algo condicional. A verdade se sobrepõe as pessoas e as condições impostas, pois ela existe por si mesma, é eterna e divina. O problema é que os homens estão cegos e surdos e só querem ver e ouvir aquilo que lhe interessam e satisfazem o seu ego. Como exemplo, as pessoas só vão a um seminário com o propósito de que os palestrantes digam aquilo que atendam as suas expectativas, razão porque as palestras têm abordagens muito repetitivas e o contraditório nem sempre se estabelece. Por quê? A verdade, às vezes, machuca os ouvidos e fere o orgulho pessoal, mexe com as certezas e aquilo que alguém tem por verdadeiro. O primeiro comportamento de confronto com a verdade é o desprezo e a zombaria; depois, vem a calúnia e a perseguição.
A verdade tem o único Dono que arbitra sobre todos os homens. Nós, porém, podemos ser usuários da verdade, pois ela não se resume a fala, mas a comportamentos, atitudes, exemplos. Pode ser até fácil dizer a verdade; difícil é vivê-la com integridade. Quem se orienta pela verdade não é guiado pelos seus impulsos, rompantes de razão ou senso pessoal de justiça.
CONCLUSÃO
Na feira das vaidades encontraremos gritos de pressupostos arautos da verdade, sendo que alguns se julgam mais verdadeiros e mais honestos que outros. Contudo, eles se colocam acima da verdade como se ela fosse uma mercadoria manipulável para satisfazer os seus próprios interesses de autopromoção. Contudo, os humildes são servos da verdade, nela depositam sua esperança e a repartem como fruto saboroso a ser compartilhado.
REFERÊNCIAS:
Não vou citar referências além da Bíblia Sagrada nas versões de João Ferreira de Almeida.

sábado, 22 de outubro de 2011

EU TENHO ESPERANÇA

Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUÇÃO
Gosto de falar de sonhos, pois eles abrem as janelas da alma, reacendem a chama da existência e criam significados para a vida. Aliás, a vida só tem sentido se for revestida de propósito. Ninguém existe simplesmente por existir. Há uma razão para a existência que remota para a origem de cada ser humano e vai além da discussão da ascendência, pois passa pela transcendência que nos envolve. Contudo, falar do transcendente, do espiritual ultrapassa a dimensão da matéria. Por isto, muitos têm receio de se aventurar nessa área e estão propensos a afirmar: “são coisas de metafísicos fanáticos”.
FLERTAR COM A ESPERANÇA
A esperança não surge do nada. Ela é fundamentada em uma crença que, por sua vez, orienta uma filosofia de vida. Ou seja, eu sou aquilo que acredito e isto vai definir o passo a ser dado, o meu futuro. Ninguém consegue viver sem uma crença ou uma ideologia: cristãos, místicos, ateus, judeus, gentios, ricos e pobres, etc. Apesar dos materialistas apontarem foco da sua esperança na emperia e a ciência; contudo, acredito nos mistérios da alma invisível, reclamando por imortalidade. Sou forjado a acreditar no dualismo da existência: matéria e espírito. Por isto, penso na forma que a alma se materializa por meio dos sonhos, viajando por lugares repletos por sombras ou por cores no desenho dos desejos ou revelando mistérios ou enigmas.
Falar do sonho é flertar com a esperança que, por sua vez, aponta para o futuro e abre as cortinas da eternidade. A esperança é uma das três virtudes mais excelentes do Cristianismo e, para ela, a morte é apenas um eufemismo. Por isto, me visto de esperança todos os dias ao acordar mesmo tendo consciência da brevidade da vida. Acredito que a esperança dá novo significado à vida, revestindo-a de imortalidade. Assim, a crueza da vivência diária não se contamina pelo desespero, pois estará amparada na crença de que o choro cessará ao raiar do novo dia.
Ter esperança não é viver alienado à espera do milagre ou ter um otimismo ingênuo. A esperança é a virtude que empurra o ser humano superar os desafios e o combustível da fé para se alcançar os vôos altos nos horizontes da vida. As pessoas otimistas acreditam nos seus sonhos e reúnem energia e esforços para realizá-los apesar das dores e lágrimas. Mesmo com todo o sofrimento sabem que com alegria colherão os frutos saborosos da felicidade.
O mar é uma das ilustrações mais aplicadas a nossa existência. Claro, o mar tem senso de humor impressionante e, mesmo com os dias calmos e tempestuosos, conserva a sua grandeza e humildade. Assim, a nossa vida tem momentos de dificuldades que nos roubam a energia, a saúde e até mesmo os bens, mas não pode roubar a fé e a esperança que é o nosso salvo conduto para a nossa ressurreição física, emocional e espiritual. Às vezes, a carne se consome pelas enfermidades e moléstias de toda sorte, porém ninguém pode matar a esperança. Só a pessoa afligida que pode debilitá-la e fazê-la fenecer, mas, se der oportunidade para a fé, ela pode renascer das cinzas e trazer à luz a existência.
Fico na espreita de que amanhã raiará o sol da liberdade. Há coisas que conspiram contra a esperança como, por exemplo, a persistência da adversidade consume todas as forças e energias e tendem a roubar a fé. Mas, não vou cessar de ouvir a música de Deus nos meus momentos tristes nem ficar alimentando pensamentos de autocomiseração na fria sala do meu quarto. Vou me ungir com os ungüentos da graça e me vestir de alegria ao despertar para o novo dia.
Lembro-me da infância dos sonhos de exercer diferentes profissões. Agora vejo que não consegui realizar o sonho em nenhuma dessas profissões, mas cheguei bem perto. Claro, o sonho é uma aposta, um caminho e não um lugar e uma proposta que se constrói no caminho no caminhar. De outro modo, sua realização não envolveria esforços emocionais, intelectuais e físicos. Convém ressaltar que alguns conseguiram chegar ao seu sonho por saber administrar bem as oportunidades e pelos seus próprios méritos, mas outros chegarão bem perto ou descobrirão outra vocação relacionada ao serviço ao próximo.
O sonho não pode ser individualista, egoísta e soberba porque isto manifesta o desejo de sobrepor ao próximo, saciar a sede de poder, fama e luxo. Por consequência, surgem os regimes opressores movidos pela paixão do domínio sobre o próximo. Essa paixão individualista, fabricada na panela do inferno, divide pessoas e suscita disputa e morte.
Trago à memória o célebre discurso do pastor e ativista social Martin Luther King Jr que declarou: “eu tenho um sonho”. Aprendo que um sonho não se realiza nas câmaras da acomodação. Exige esforço, luta e sinergia. O sonho de transformação social se constrói lutando contra um sistema de pensamento dominante e contra uma ideia equivocada. A história comprova que não é tarefa facial e registra muitos mártires, incluindo o próprio o Cristo que pregava a “Grande Ideia de Deus” que contrastava com a doutrina dos religiosos e líderes políticos da época. Também, o pastor Martin Luther King morreu assassinado por alguém contrário o seu ideal de mundo igualitário para todas as raças e de diferentes posições sociais. Portanto, pode-se matar um homem, mas não pode matar as suas ideias.
Quero sonhar os sonhos de Deus com suas imagens que mostram as virtudes a serem adquiridas pelo ser humano. Essas imagens apontam para aspectos da minha vida que precisam ser melhorados, principalmente no relacionamento com o próximo. A vida é uma via de mão dupla na qual, se não obedecermos a sinalização, faremos vítimas: a nós mesmos e o próximo. Essa sinalização diz respeito ao amor ao próximo e a tolerância que devemos em relação aos mansos. A convivência pode ser agradável se soubermos conviver administrar bem os conflitos por meio do diálogo.
Gosto da forma como Nelson Mandela fala do Ministério da Verdade e da Reconciliação, criada quando era presidente da África do Sul. Segundo ele, era preciso a vítima acreditar na integridade do seu agressor para que ambos expressassem livremente os seus sentimentos e acontecesse a reconciliação. Dentre os relatos, diz que muitos agressores choraram e diziam que não sabiam que tinha feito tanto mal e suplicavam o perdão. Claro, há males que são irreparáveis e se esgotariam todos os recursos do mundo e, nesse caso, a privação da liberdade apenas atenua a sensação de injustiça. Por isto, a nova abordagem que ganha voga é a justiça restaurativa que leva a pessoa a reconhecer o seu erro, empenhar-se pela sua reparação e produz reconciliação com a sua vitima. Ou seja, produz recuperação do indivíduo para não torná-lo um transgressor contumaz e devolvê-lo restaurado à sociedade.
Apesar da convulsão social e a degeneração dos lares, continuo tendo esperança na instituição família. Acredito que o melhor investimento de governo deve ser dirigido às famílias, pois esta é a celular mater da sociedade. A degeneração da sociedade começa com o conflito conjugal que atinge a família como um todo. A perda da referência moral causada pelo desgaste da relação familiar coloca crianças e adolescentes a mercê dos ventos da impiedade, trazendo conseqüências para toda a sociedade. Penso que o problema deve ser atacado na sua raiz e não ser apenas remediado por famigerados programas sociais. O problema reside na falta de esperança e de perspectiva de vida das pessoas a começar no seio das famílias.
Mesmo com as dificuldades de hoje e amanhã, continuo firme na fé de que um dia a terra será restaurada da ruína que lhe consome. A terra está banhada do sangue das vítimas das guerras e da violência, produzida pela má índole, pela ganância dos homens e pela disputa de poder. Ainda, hoje inocentes e culpados são levados aos antros da morte. A insegurança campeia ao nosso redor e sinaliza que podemos ser a próxima vítima. Mesmo assim, acredito na justiça eterna da retribuição a cada um segundo as suas obras quer tenha feito o bem ou mal. Por isto, creio que o cálice da impiedade será dado aos homens e para os justos brilhará o Sol da Justiça.
CONCLUSÃO
A esperança é o balsamo para a alma ferida. É um rio no deserto da vida, irrigando as raízes da árvore da existência. É a porta que se abre quando as possibilidades falham. Às vezes o esforço humano torna-se insuficiente, sendo necessária a esperança para acreditar que há uma saída. Por isto, quem vive de esperança é mais que um sonhador. É um precursor de boas notícias de consolação para aqueles que estão aflitos e amargurados com a consolação na qual foram consolados.

REFERÊNCIAS
Não vou indicar referências, mas vou recomendar que leiam alguma obra biográfica da vida da Martin Luther King Jr.

sábado, 8 de outubro de 2011

AS RIQUEZAS DA INJUSTIÇA


Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUCÃO
Recentemente tenho participado de reuniões, conferências e debates que têm como pano de fundo: a corrupção. Tais eventos expressam a desconfiança na justiça, na piedade e na boa fama, principalmente quando se utiliza recursos públicos. Nesses debates é defendida a rigorosidade empírica dos documentos que vai além do que se expressa como honesto e justo. Por isto, a prática da conferência expressa a transparência própria daquilo que se percebe harmônico e coerente nos seus diferentes ângulos. A verdadeira face de cada um está escondida em máscaras da honestidade e da bondade, pois impressionar é a estratégia mais utilizada no jogo do poder.
A QUEBRA DE REGRAS
Uma das expressões que ecoou aos ouvidos de todos como flecha lançada a esmo ao ar a procura de um alvo foi a frase dita por um dos palestrantes na 1ª Conferência Municipal de Transparência e Controle Social. Era flecha dirigida aos corações com o intuito de dividir ao meio todas as certezas e contradições, pois atingia as motivações, ideologias e práticas das pessoas, convidando-as a enxergar pelo menos um palmo de coerência. Por isto, não houve contestações quando foi dito: “todos são corruptos”. Era uma das demonstrações de que a corrupção era inerente ao ser humano acostumado a quebrar regras e a negociar a impunidade da sua transgressão ou até mesmo o silêncio da conivência daqueles pressupostamente honestos.
Se a palavra corrupção significa “quebra de moléculas que leva a destruição da matéria”; então, no contexto sócio-político, indica quebra de regras que leva à desordem social. Nesse caso, cada pessoa comete uma mínima transgressão do ponto vista: educacional, ecológico, legal e outros. Como exemplo, vejo nossas ruas cheias de lixo, mesmo havendo lixeiras perto ou distante. Com consciência ambiental, as pessoas evitariam que esses resíduos fossem para os bueiros e que, nos dias de chuvas, houvesse enchente. Claro, quase todas as tragédias foram provocadas por quebra de regras e não podem ser consideradas fatalidades. Isto vai desde o barateamento da construção à desobediência às leis de trânsito.
Hoje, o exercício da piedade é execrado. Quem se entrega ao trabalho, cumprindo suas obrigações funcionais é chamado de “Caxias” e outros pejorativos. O levante silencioso contra toda a forma de ordem é louvado, mesmo que seja lesivo para os usuários do serviço público. A banalização do serviço público é um exemplo da corrupção implícita, do mau feito e do desinteresse, denegrindo a imagem do servidor público.
A transgressão já começa dentro dos lares diante da complacente autoridade dos pais. Parece que a experiência da Ditadura Militar provocou trauma nas famílias e os pais temem usar a autoridade com medo de serem autoritários, tornando-se inseguros. Assim, querem ser liberais sem definir limites aos filhos e estes são impelidos às práticas mais abomináveis. Depois, há uma tentativa desesperada de salvar uma geração perdida, mergulhada nas drogas e na delinqüência, sem perdoar classes sociais: pobres e ricos.
Concordo que o âmago de cada indivíduo é ter uma sociedade melhor, sem os vícios culturais que se perpetuam no seio das famílias e nos antros políticos. Mas, os políticos são gerados pela sociedade que é mista e conflituosa, com suas diferentes classes e interesses. Logo, de alguma forma, a política reflete a lógica desse jogo de interesses. A disputa é um jogo de domínio sobre as bênçãos da legalidade e do favor do capitalismo. Como disse, certa vez, o capital é o combustível do poder pelo qual muitos macularam sua alma.
O fascínio do poder está na fama que confere superioridade aos homens à semelhança dos deuses. Apesar de a igualdade ser apregoada como princípio, desde a Grécia Antiga foi propalada a ideologia de uma raça superior composta de intelectuais, abençoada pelos deuses, enquanto que os demais homens seriam servos. Por isto, os políticos e quem detêm poder são chamados de excelência, meritíssimo e outros.
A PRERROGATIVA DO PODER
O poder não é prerrogativa somente dos agentes políticos, mas de cada pessoa. A política é inerente ao poder e este essencial à política. Logo todos são políticos: conscientes ou alheios, exercendo ou não função pública. Nesse caso, todos estão propensos a se submeter às práticas mais perversas do poder, mesmo sem exercer função pública, tanto que existe compra de votos e laranjas. Não são, porventura, pessoas comuns isenta de suspeitas devido a sua carência intelectual, social e outras que se submetem ao jogo do poder de forma doentia? Nesse caso, são cumplices ou vítima ou as duas coisas ao mesmo tempo? É inegável que a corrupção existe desde os primórdios da humanidade, sendo causa de revoltas, guerras e até a mudança da geografia do mundo.
Sou forçado a concordar com o filósofo Jean-Jacques Rousseau (1712 – 1778) de que “a sociedade corrompe o homem”. Observo que, apesar de condenado por alguns, o jeitinho brasileiro é parte inerente a nossa cultura. Essa forma de resolutividade expressa o mau feito, desleixado, provisório e até mesmo a trapaça. Isso mostra que remediar é a alternativa mais visível para um problema urgente cujo diagnóstico reclamava solução antes mesmo de vir à tona.
A razão da transgressão está explicada no anseio do homem em exercer o domínio sobre as outras pessoas, porém esse domínio é predominantemente opressor do mais forte sobre o mais fraco. Por isto, foram criadas regras para proteger o mais fraco, porém não se trata de uma concessão dos poderosos, mas de uma conquista por meio de luta reivindicatória.
O argumento do medo do confronto é obstáculo para qualquer mudança. Toda mudança é traumática, revolucionária e provoca danos, desequilíbrio. Não é fácil tirar as pessoas da sua zona de conforto e conduzi-la a uma nova filosofia de vida. Claro, idéias erradas norteiam filosofias e práticas de vida equivocadas e, nesse caso, traz grandes conseqüências na sociedade.
Percebe que há grande investimento em palavras no sentido de que a mudança aconteça. Observo que, quando se fala em educação como instrumento de mudança, pensa-se nas palavras dos professores dirigidas aos seus alunos em uma sala de aula. Também, tenho ouvido muitas palavras de ordem, de indignação e de cobrança no intuito provocar mudança de postura nas autoridades.  Contudo, são apenas palavras semeadas e os resultados dependerão da sensibilidade da terra (coração do homem).
Acredito que o melhor ensino começa pelo exemplo no interior dos lares. Já foi dito que a família é célula mater da sociedade. Assim sendo, se tivermos famílias bem educadas teremos uma sociedade menos conflituosa. Também, deve-se considerar que o melhor investimento deve acontecer nas famílias, pois quando se fala em educação se pensa em escola. Penso que a educação mais eficaz começa na família e isto requer atenção e exemplo dos pais aos seus filhos.
A queixa evidente é que, na contramão da educação da família e da escola, temos uma mídia irresponsável que divulga valores controvertidos e promove a banalização da violência, do sexo e das relações humanas. Além disto, apresenta a ilusão das riquezas e alimenta o consumismo das pessoas, inclusives daquelas com recursos insuficientes para adquiri-los. Assim, valoriza o ter, a fama e o sucesso do que o caráter e a boa fama. Ou seja, o mais importante é o que a pessoa tem do que o que ela é realmente.
Nessa ilusão, muitas pessoas apresentadas na mídia têm dinheiro, fama e posição, mas são de caráter doentio: promíscuos, boêmios, arrogantes e, algumas delas, envolvidas em crimes.
CONCLUSÃO
Já foi dito por Rubem Alves que nós somos formados de palavras, as quais grudam no nosso corpo como uma tatuagem. Desde que nascemos recebemos informações, instruções que formam a nossa coroa de pensamentos e orientam as nossas ações. Outra analogia é que os homens são como árvores plantadas. Aqueles que nasceram junto às correntes das águas da justiça aprenderam desde cedo aquilo que é boa fama, honesto e verdadeiro. O menino ensinado no caminho da equidade quando for adulto dificilmente será seduzido pelas riquezas da injustiça.
REFERÊNCIAS:
Vou apenas recomendar a leitura dos seguintes livros:
ALVES, Rubem. O céu numa flor silvestre: a beleza em todas as coisas. São Paulo: Versus Editora, 2008.
HART, Stuart L. O capitalismo na encruzilhada: as inúmeras oportunidades na solução dos problemas mais difíceis do mundo. Tradução de Luciana de Oliveira da Rocha Porto Alegre: Bookman, 2006.
REZENDE, Maria Gonçalves de. Relações de Poder no Cotidiano Escolar. Campinas (SP): Papirus, 1995.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

O ABRIGO DO TEU CANSAÇO

Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUÇÃO
Chega-se a mais um fim do dia para contabilizar as ansiedades passadas e projetar a tônica da nova rotina. O regaço está preparado para acalantar um corpo cansado pela lide diária, reduzir o pensamento acelerado da antecipação da precipitação do novo amanhecer.
Somos loucos nos sonhos de que a jornada será serena e que os embates serão vencidos na previsibilidade das nossas expectativas. Também, somos crianças no entretenimento do sono, brincando com heróis e vilões, sofrendo e vencendo as batalhas da fantasia.
Contudo, envelhecemos quando nos privamos da capacidade de vivenciar a fantasia do sonho, ficando a mercê dos pesadelos da aflição dos pensamentos. São os espinhos da liberdade que nos entrega responsabilidades e conseqüências. Ficamos a mercê dos frutos das decisões certas e equivocadas, sendo castigados pelos açoites da consciência.

A IMPORTANCIA DA SENSIBILIDADE
A arte de viver a vida traz de presente o nosso próximo como parceiro imediato da nossa existência. Ele é nossa parte incompleta que faz nos ver qualidades a serem admiradas e defeitos a serem rejeitados. Parece o espelho da verdade que reflete a nossa expectativa de perfeição e contrasta com a nossa incompletude. Por isto, o anseio de perfeição é a nossa maior fantasia e a correção do próximo é nosso maior fetiche. Algumas vezes, sádicas, e masoquista quando punimos a nós mesmos com a autocomiseração.
Vivemos pelo prazer e pela curiosidade em descobrirmos a verdade sobre nós mesmos, mas cânon divino nos ensina que a verdade passa pela humanidade com o próximo, pois “Deus é Amor” – o amor que torna a Vida em morte que ressurge para dar vida a todos. Desta forma, descansamos a consciência para a culpa e para vida em paz. Essa paz que produz bem-estar até mesmo nos momentos de dificuldades, que se alimenta de esperança e produz perseverança. Desta forma, o aguerrido soldado da vida não desiste diante das adversidades, mesmo que elas se apresentem acompanhadas das manifestações dos profetas do caos. Quem se veste da certeza da vitória fica no acampamento dos alienados que fecha seus ouvidos para a dúvida e o desânimo. Assim, acredita que o tempo envelhecerá a tribulação e ela ficará impotente diante da força do amor.
Vou adormecer no deserto da alma, despido das vaidades no sentido do meu viver, sem chorar as expectativas frustradas como se fosse o mais insignificante dos seres humanos. Ficarei abrigado na caverna para ouvir a música de Deus e renovar a esperança, fazendo novo jeito de caminhar na caminhada. Assim, abrirei os olhos da alma para ver os lírios do campo: a beleza que brota ao voar nas asas do espírito.
As marcas que trago em meu corpo são testemunhas do aprendizado acumulado por meio dos erros e acertos. Os arrependimentos talhados nas tábuas do coração me redimiram de toda arrogância e me conduziram ao caminho da humildade. Por isto, até o saber acadêmico e profissional tiveram que consultar a voz da sabedoria para agir com bom senso e prudência.

É NECESSÁRIO LIBERDADE PARA VER A BELEZA
A beleza descansa os olhos e traz os detalhes das cores. Por isto, o verde nos convida para ver o útero da natureza de onde partimos uma vez. Essa natureza – a casa – que destruímos para delimitarmos o espaço do nosso poder. Aliás, a guerra começou a partir da delimitação do espaço, quando o primeiro homem se apossou de um campo, colocou a cerca e disse: ”é meu”. Ainda, a guerra no campo é motivada pela disputa da terra.
Sou livre para ver a beleza nos olhos da criança, pois no seu mundo não há disputa de poder, batalha dos egos e em cada olhar e percepção é um novo aprendizado. Que pena! O adulto montou no cavalo da razão para levar cativo todo pensamento que se levanta contra suas paixões. Assim, a batalha da argumentação e do convencimento entrou no mundo dos adultos e fez à primeira vitima: a criança. Nesse caso, a fantasia tornou-se um filme de terror, repleto de malícia, de subversão e de opressão.
A beleza que busco está na sensibilidade dos puros de coração, que habitam nas campinas de misericórdia e de paz. As palavras desses sábios anônimos são maçãs de ouros em salvas de prata que alimentam os corações sedentos de esperança e conforto. São palavras que saram os feridos da alma, pois consolam os atribulados e lhe renovam as forças. Por isto, suas palavras são músicas que acalentam aqueles que precisam descansar de suas obras e inaugurar um ciclo na existência.
A beleza que busco está na poesia da existência, mesmo que irregular no seu marco histórico, mas crescente na riqueza do aprendizado. E, nesse amadurecimento, sou como pedra lavrada nas mãos do Criador e nela escrevo a minha história.
CONCLUSÃO
Ouvir a voz do coração é mover-se de misericórdia frente às necessidades do próximo e descansar na paz que a benevolência produz. Isto não tem relação com as doações midiáticas, que traz benesses econômicas e visibilidade efêmera com a hipocrisia das sobras. A bondade é simples como uma pomba e suave como a brisa. É tão espiritual como vento e, ao mesmo tempo, persuasiva e contagiosa para mover uma multidão como um só homem. Produz solidariedade, porque prima pela igualdade na comunidade mais pobre onde pão é repartido com todos.  
REFERÊNCIAS
ALVES, Rubem, O céu numa flor silvestre: a beleza em todas as coisas. São Paulo: Versus Editora, 2008.


sexta-feira, 29 de julho de 2011

A CORTINA DO AMANHÃ

Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUCÃO
Na loucura incessante da vida, vejo como a rotina conduz a um estágio de conforto, tornando factível a reprodução mecânica dessa rotina. Assim, de manhã à noite, o círculo se fecha pelas mesmas coisas e até a alimentação é obrigação física da sobrevivência. O trabalho que nos aliena só se liberta da rotina quando se reveste de crenças teológicas, morais e ideológicas.
Um dos meios que nos liberta é a crença na doutrina espiritual de família, pois não se trata apenas da célula mater da sociedade, mas de um conjunto de relações entre pessoas. A família traz a ideia de partilhamento de uma mesma origem e existência, com suas concepções de ascendências, genes e preceitos cultuais e culturais. Por isto, as entranhas se movem quando percebemos que somos parte de um todo, partilhando o mesmo sangue e essência. Tal preceito foi enriquecido no cristianismo por meio da fraternidade; ou seja, amor que une e se solidariza entre irmãos, fazendo perceber com a mesma carne e os mesmos ossos. Desse modo, rompem-se as concepções de afinidades por laços de sangue, mas estabelece-se a crença de que toda humanidade tem um ancestral comum e origem divina.
A BREVIDADE DA VIDA
A vida hoje se forja na aflição, na ansiedade, na incerteza dos segredos que serão descortinados amanhã. Nesse caminho de rosas e espinhos, os pés sangram pelas intempéries ocasionais, mas olhos brilham pela esperança que move a perseverança nos mesmos ideais e promessas. Somos participantes da mesma natureza de vida e estamos seguros na paixão que nos move e nos faz acreditar que a vida vale a pena. Por isto, valorizo o sonho como a luz que brilha no caminho apontando para o futuro, retirando-nos da estratosfera do presente e nos libertando das amarras das culpas do passado.
Quando critiquei a velocidade do mundo moderno, estava criticando a mecanização do homem como se fosse mais uma máquina de uma unidade de produção. Nesse caso, estava me referindo à rotina e à perda da humanidade que reduz as relações entre pessoas ao rito de tarefas e responsabilidades. Estava convidando as pessoas a se perceberem como “ser-no-mundo” (um importante preceito existencialista), com os detalhes da natureza que nos cerca e procurassem enxergar a sua própria alma por meio do espelho da reflexão. Como dica, citei a fé em Deus e a doutrina moral e espiritual que a cerca como meio para enxergar as imperfeições da alma e melhorar a conduta existencial em relação a si mesmo e o próximo.
Agora, com a mesma disposição de um guerreiro, que mesmo ferido não cessa de lutar, faço da labuta uma visão de uma missão especial em direção à justiça neste mundo onde não há iguais. A igualdade da origem e essência humana trazida na inocência de uma criança é maculada pela corrupção da sociedade, repleta de adultos imperfeitos e concorrentes em sua verdade própria – produto de um individualismo exacerbado. Por isto, tenho a crença e a consciência de que os valores absolutos estão fundados no amor e na misericórdia, reconhecendo que a diferença entre pessoas não torna um ser mais excelente que o outro. A excelência da elevação do espírito humano só acontece por meio da fé na transcendência divina e na renúncia da própria verdade, soberba e egocêntrica, por aquela torna o serviço ao próximo uma missão da existência.
Tenho na incerteza do hoje e do amanhã, o testemunho vivo da fragilidade humana marcado pela brevidade da vida. Aprendi que a brevidade da vida possui três dogmas. Primeiro, a existência é curta e quem passa dos 70 anos de idade experimenta enfado e canseira. Nesse sentido, o preceito bíblico anuncia que Como a erva do campo assim são os dias dos seres humanos; como a flor do campo assim são; mal o vento sopra, logo deixam de existir, e o seu lugar se esvai.”
 Por sua vez, o ser humano deve ter norte para a sua vida e não gastar a vida – seu maior bem – com coisas que degradam o corpo e o espírito.  Por isto, a vida deve ser entendida a partir de um propósito: já que nasci, o que eu posso fazer e como será o fim dos meus dias? Penso que alguns vêem a vida como uma guerra de oportunidades e, por isto, devem derrubar o próximo oponente ou se, possível, usar de todos os artifícios para alcançar a melhor posição e acumular capital, bens... Essa visão tola e marginal divide o mundo entre senhores e servos, ricos e pobres, intelectuais e leigos, e provoca disputa, invejas, corrupção e violência.
O segundo dogma sobre a brevidade da vida revela que a estrutura do ser humano é frágil e a existência pode ser interrompida a qualquer momento. Apesar dos avanços da medicina que prolongam a vida, temos uma geração de enfermos que convivem anos com doenças incuráveis. Contudo, isto não freia a promiscuidade moral, intelectual e social dessa geração que clama por liberdade sem limites, irresponsável, individualista e amoral. Até mesmo a liberdade dos zumbis é defendida como uma política de redução de danos, reclamada como exercício da vontade de consumir as drogas que lhe apraz, mesmo que isto tenha um custo social caro. Lamentável saber que a vida dos outros é tratada apenas como política pública de direitos, ignorando que dentro de cada ser há uma alma que reclama por socorro.
No terceiro dogma da brevidade da vida descobrimos que estamos rodeados de inúmeros perigos. Por isto, certo orador declarou que vivemos na geração das chaves quando queremos proteger nossa vida e o nosso patrimônio. Asssim, as mortes de adolescentes e jovens inauguram o momento da inversão da contagem dos fins do dias, pois os pais passam a sepultar os seus filhos. A vida tornou-se uma experiência perigosa, marcada pela certeza de que nossa existência pode ser interrompida a qualquer momento por capricho da fatalidade ou pela violência que tão de perto nos rodeia.
Assim, contar os dias da existência é uma alvorada conveniente a cada dia, porém somos blindados em nosso espírito pela confiança na transcendência e crença da imortalidade da alma. Ao contrário, há pessoas que convivem com fantasmas dos traumas da violência, operados por espíritos ministradores do caos, vivendo imergidos na depressão e na síndrome do pânico. Claro, temos instinto de autopreservação, não queremos morrer mesmo a cada dia percebendo a contagem decrescente da vida. Contudo, valorizamos a vida como patrimônio imaterial mais excelente que visualizamos por meio dos nossos sentimentos, vontade e intelecto. Desse modo podemos ver a nossa alma pelo espelho da existência dos outros e nosso fim na tristeza dos atos fúnebre. Nesse momento, somos contaminados por imagens mentais e desejamos que nosso espírito viaje ao exterior do mundo espiritual para sondar como seria a separação da alma do corpo. Por isto, lamento como a perda da humanidade leva alguns a considerar a vida de alguém uma coisa banal, paga de uma vingança insana e até mesmo recreativa.
A DISCIPLINA NO JARDIM DA EXISTÊNCIA
Contudo, mesmo diante da brevidade da vida, vou celebrar sempre a alvorada do amor e a paz no meu jardim da existência. Vou colher a alegria nas tribulações para não me afligir por causa das debilidades alheias. Sei que das possibilidades e impossibilidades sou forjado a entender a razão da existência como atos milagrosos que cancela todas as desculpas da sorte e do acaso. Isto leva a uma existência responsável, respeitando a leis do corpo, da alma e do espírito, a cuidar da saúde da mente, preservando-a dos vícios malditos, apagando a candeia dos olhos para a má literatura e a recreação perversa. Nesse caso, considero verdadeiro o dito Jean Jacques Rousseau: “a criança nasce pura quem a corrompe é a sociedade”.
Vivemos em uma sociedade perversa e isto nos desafia a não nos conformar com ela, pois, de outro modo, seremos enquadrados em seus moldes. Primeiro, aceitando intelectualmente seus preceitos e, depois, considerando convenientes suas práticas. Por isto, a renovação do pensamento é vital para a sobrevivência moral e espiritual nesse mundo de valores controvertidos. Podemos considerar essa renovação como a remoção de um vírus, quando se torna necessário formatar o computador e reinstalar todos os seus programas originais sem danos à memória e ao processamento das informações. Assim, a renovação do pensamento não é um convite à ignorância e ao radicalismo, mas um caminho permanente à integridade moral e aos valores absolutos da fé e da razão.
A prática de pensamento e vida moral sadios leva o homem a desenvolver o domínio próprio. Ou seja, posso fazer o que quiser, mas não vou fazer tudo o que quero. Por exemplo, posso revidar por palavras ou atos quando provocado, mas eu determino que não vou pagar o mal com o mal, mas, sim, com o bem. Acredito que, mesmo em uma sociedade marcada pela competição e o individualismo, posso marcar minha geração, deixando um legado moral inatacável. A nossa sociedade clama por exemplos. Por isto, qualquer ato isolado de um mendigo que devolve uma quantidade de dinheiro achada no lixo ao seu verdadeiro dono é comemorado como um fenômeno de honestidade. Parece que a imprensa quer fazer um contraponto à corrupção dos políticos e dos poderosos ao mostrar que um pobre pode abdicar da sua necessidade em favor de um valor mais excelente que é a honestidade.
CONCLUSÃO
A fé e a razão não estão em dois extremos como pregam algumas pessoas. A fé é cultuada racionalmente, despida de fanatismo e materialismo, como doutrina sadia, amorosa e servil ao próximo. A renovação do pensamento nos liberta das obras mortas do passado e aponta para o descortinar de um novo amanhecer. Assim, posso dormir em paz com a sensação de que ao acordar colherei os frutos saborosos da árvore da esperança. Também, nos meus sonhos não estou sozinho, pois a colheita dos frutos da esperança é a celebração da caridade fraternal.
REFERÊNCIAS:
Não vou citar referências. Recomendo a leitura de obras do filósofo Sêneca sobre a brevidade da vida.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

O SISTEMA DE CRENÇAS NO PÓS-MODERNISMO.

  
Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUÇÃO
A doutrina plural criada por intelectuais, artistas, jornalistas e outros formadores de opinião, tenta desconstruir o pensamento das massas populares. A forma de pensar das massas possui a riqueza mística, metafísica que traduz a herança cultural do povo, suas crenças, religião e costumes. Mas, a proposta da racionalidade localizada na areia movediça da subjetividade torna toda crença e conhecimento adquiridos uma verdade de valor duvidoso, diante do novo argumento que suplanta todas as certezas.
A SUBJETIVIDADE NO PÓS-MODERNISMO
O advento do pós-modernismo colocou em cheque todas as certezas para dar razão a todas as vozes. Nessa nova ordem, os direitos de todos e de cada um tornam-se abrangentes e alienantes pelo clamor das vozes de todas as classes, segmentos e minorias. 


Podemos considerar que o pós-modernismo trouxe o benefício do reconhecimento de direitos das crianças, dos idosos, dos deficientes, etc. Mas, também, trouxe algumas polêmicas que conflitam na orientação cristã de grande parcela da população, como alguns direitos reivindicados por homossexuais, por movimentos que defendem o reconhecimento profissional das prostitutas, a legalização e discriminação de todas as drogas, a liberação do aborto e da eutanásia.
A gritaria de certos segmentos em reclamar direitos esbarra-se na muralha das crenças da população. Ou seja, a discussão de determinação políticas de direitos coletivos deveria considerar a discussão ético-religiosa. Do ponto de vista individual, a discussão ética encontra consonância no princípio do livre-arbítrio, pois cada pessoa pode fazer o que lhe convém, desde que não seja um meio para se omitir das obrigações legais. Em uma discussão filosófica existencialista, o livre arbítrio é o exercício moral da razão que pode ser limitado por determinadas convenções, pois cada pessoa no afã de satisfazer as suas vontades até as últimas conseqüências fica atraída por seus instintos mais primitivos a agredir o próximo. Essa agressão é mais moral do que física, pois há marcos históricos cuja remoção gerará sérios conflitos ideológicos.
O povo brasileiro nasceu no berço esplêndido da orientação judaico-cristã, tendo, em sua história da educação, a escola dos jesuítas e sua doutrinação de fé. A cultura judaico-cristã que nos abraça é a nossa herança moral que norteia os valores prevalecentes na sociedade. Inclusive a Constituição Federal invoca a “Proteção de Deus”, reforçando a influência religiosa em um Estado que se proclama laico. Assim, a laicidade do Estado não é pressuposto de eliminação de crenças, mas do ordenamento do respeito a todas as suas manifestações. Por isto, estamos cercados de templos e de preceptores que reproduzem esses valores: amor, casamento, sobriedade, preservação da vida, etc. Por causa da tradição religiosa cristã, o pastor e o padre têm mais autoridade do que qualquer político e intelectual en seus ensinamentos de profissão de fé. Porém, há de lamentar como, em casos isolados, lideres utilizam a manipulação e o uso sórdido do poder em benefício próprio, tornando propícia a inútil frase de Karl Marx: “a religião é o ópio do povo”.
Contudo, a prática de fé do povo brasileiro é contraditória do que é ensinado, do que se crê e o que pratica. O sincretismo religioso revela a convivência com diferentes religiões de princípios doutrinários antagônicos que se fundem gerando uma more mística. Por isto, há quem se declare religioso não praticante, aceitando a vivência da fé da conveniência. A polarização entre católicos e evangélicos resulta da crise das instituições, resultando a convivência com novas formas de pensamento, incluindo o pós-modernismo. Disto resulta o crescente materialismo das disputas por números de adeptos numa gritante denúncia da coisificação do homem. Isto acontece até mesmo entre igrejas do mesmo segmento. Daí surge a ortodoxia doutrinária da conveniência que torna mais visível essas disputas de poder eclesiástico e político, dando tom ao movimento religioso contemporâneo.
Considero relevante a opinião de Myles Munroe de que “ninguém pode matar uma ideia, pois ela vai se multiplicar” e dá uma dica de que “para acabar com uma ideia deve combatê-la como uma ideia melhor”. Logo, o duelo de ideias torna-se uma premissa para desconstruir uma crença nascida com o povo brasileiro.
Uma das estratégias é desqualificar a crença no livro sagrado, utilizando o método crítico do texto chamado Desconstrucionismo, que julga todas as interpretações igualmente válidas ou igualmente destituídas de significado (dependendo do ponto-de-vista de quem o analisa). Isto significa desconstruir a verdade, inserindo a dialética da suspeição, mudando sua vertente para uma interpretação mais condizente como o ponto de vista de quem lê, apontando incoerências e erros.
Nesse caso, os princípios do pós-modernismo implica o individualismo, a subjetividade, o relativismo moral e o pluralismo de ideias, tornando a sociedade uma babel com muitas vozes e disputa de espaço de razão e de poder.


O fundamentalismo da subjetividade se contrapõe a qualquer valor que se julgue absoluto, enquadrando a objetividade nos critérios científicos e jurídicos, dando-lhe a vestimenta da imprecisão. Aliás, a única verdade objetiva é: “cada cabeça tem uma sentença” ou como Rubem Alves costuma dizer: “o que dizemos é apenas um palpite...”
A LIBERDADE E O PLURALISMO DE IDEIAS
O pós-modernismo tem também sua substância no pluralismo religioso, ético e moral. Logo, o pressuposto da suspeição dissemina a doutrina de que todas as religiões estão certas ou todas estão erradas, que cada pessoa tem a liberdade para definir o que é certo ou errado para sua vida, pois todos são constituídos de direitos sobre o seu próprio corpo, interesses e vontades. Esse perigo da inconsistência de princípios torna a sociedade contaminada por um crescente individualismo, fomentando a disputa por pontos de vista, razão e aumenta o pleito por aquilo que julga de direito, gerando a inversão de valores. Por isto, a marcha pela legalização da maconha por mais reprovável que seja, encontra substância na interpretação jurídica da liberdade de pensamento que, por sua vez, se opõe a proibição legal do comércio de drogas e à discussão ética judaico-cristã.

A liberdade e o pluralismo de ideias encontram vazão no arcabouço da democracia, que é uma das melhores formas de governos comparada com a ditadura, aristocracia e outros regimes totalitários. Mas, devemos considerar que a democracia embora seja uma das formas de governo mais aceitáveis em todo mundo tem suas fragilidades. A democracia é o braço direito do capitalismo e ajuda a capitalizar dos pobres em favor dos ricos, contribuindo para a desigualdade social. Essa desigualdade acirra a guerra de classes e segmentos, pois a sensação de perda, de precariedade frente a leniência dos governos e instituições.
A idealização imprecisa de um modelo de sociedade é construída por muitas vozes e a ideia de uma sociedade plural é a somatória de conflitos de interesses de diferentes segmentos. Não se trata apenas do antagonismo de ideias, mas de uma disputa de poder de que tem mais influência nos bastidores da política, dando as suas motivações natureza legal.
O antagonismo poder público e sociedade civil resulta da ausência de aliamento de interesses, pois a política de fachada eleitoral prevalece nas obras, projetos e programas com o pressuposto de bem comum. Assim, a via de consenso não se estabelecerá pela dialética, mas por uma nova cultura de probidade e transparência.


CONCLUSÃO
A discussão da política de direitos sem um debate moral inaugura uma guerra ideológica. É impossível remover um sistema de crenças instituída como herança cultural a um povo. A transformação do pensamento acontece no decorrer de gerações, mas preserva a sua essência; por isto, não se conseguiu mudar a disciplina dos povos orientais, mesmo com os regimes totalitários e o advento do capitalismo.
A imposição legal não resolve o problema da aceitação e do consenso a determinadas práticas, pois a criminalização não elimina um sistema de crença. Apostar na educação escolar também não poderá suplantar a essência das crenças, pois mesmo o evolucionismo não conseguir eliminar a crença no criacionismo presente na cultura judaico-cristã.


REFERÊNCIAS
Não indico referências, mas convido a ler o artigo o “Pluralismo do Pós-modernismo”, de Heber Carlos de Campos.