
Professor Gelcimar da Silva Pereira Nunes
INTRODUÇÃO
A vida nos ensina nas diversas circunstâncias, inclusive nas intempéries que nos fragilizam, mas, por outro lado, nos torna sensíveis aos clamores da alma. Os momentos de melancolia da alma são propícios a introspecção necessária para pensar a vida, as atitudes, os acertos e erros. Aliás, descobri que os meus momentos mais criativos acontecem nos momentos de melancolia, quando os pensamentos afloram como a naturalidade do orvalho para brotar poesia em brasa.
Por isto, entendo porque os poetas como Alvarez de Azevedo, Casemiro de Abreu e Fernando Pessoa eram melancólicos e, ao mesmo tempo, iluminavam as pessoas com a beleza criativa da poesia, falando sobre a natureza, o amor e sobre o dilema da vida: a morte. A transitoriedade da vida era calculada pelo ideal de um mundo sem tristeza, sem a aflição do espírito. O engodo desses poetas era destruir o corpo por meio de uma vida boêmia, pois estavam embriagados pela desesperança do mundo presente, abraçando o mal do século para flertar com a morte.
A COMOVISÃO DA VIDA E DA MORTE
Os poetas românticos morreram jovens com idade variável de 21 e 25 anos. Porém, hoje flertar com a morte não está ligado ao ideal do romantismo do século VIII, que foi movimento associado à filosofia, a poesia, música, teatro e literatura. Atualmente, há jovens que se expõem a riscos devido a banalização da vida, embriagados pelo entretenimento suicida das bebidas, das drogas e de ilicitudes. Aliás, são realidades de fuga para o tédio, para a vida familiar opressora ou um meio de curiosidade para fazer uma viagem eufórica e suicida sem volta.
Lembro dos ensinos de História sobre a escravatura no Brasil e, na minha tristeza, reflito que nenhum regime opressor se perpetuará por muito tempo, pois o espírito humano que é livre sempre clamará contra a escravidão. Mas, também, penso que as algemas psicológicas persistem quando há pessoas que não conseguem se libertar de diferentes vícios e complexos. Estamos convivendo com pessoas zumbis, escravizadas pelas drogas, sem poder de decisão, sem julgamento moral sobre seus impulsos, sem afeto natural e respeito a pais e mães. Por outro lado, vejo a proliferação das fobias, da depressão e dos traumas pelas tragédias e fatalidades. As pessoas estão encarceradas em seus palácios e residências, em seus muros e grades, iludidas pela sensação de segurança na polícia e na segurança particular.
Em meio ao caos urbano, assistimos passivamente a decadência da poesia e vimos ascender à crueza da guerra contra a criminalidade. Ao invés das histórias familiares e dos contos literários, as crianças vêem as estatísticas do crime na televisão e proliferação do evangelho do medo, de uma geração sem alma, incutindo o respeito ao bandido e ao menor delinquente que nos abordar.
Percebo que as discussões ganharam alcance social, porém individualmente é egocêntrico, apesar de apregoar o bem coletivo. Assim, a barca dos insatisfeitos é revestida do realismo fantástico de busca por uma sociedade igualitária, com respeito mútuo, etc. Só não entendo por que, ao cessar a revolta, cada um volta ao nicho e a rotina, ficando os chavões guardados para o revival. Parece que as reivindicações são pedras lançadas ao lago cujos sons e ondas são respostas mesquinhas que agradam os expectadores.
Outro ponto de confronto é a beleza da amizade que e prejudicada por relações de interesse. Não basta ser amigo, até a aproximação afetuosa com determinadas pessoas passou a ser estigmatizada. Ou seja, deve amar a um e aborrecer a outro, mesmo que não haja motivo para tal feito.
Contudo, vou continuar acreditando na honestidade do riso, apregoada pelo educador Rubem Alves, pois ele convida ao exercício da sensibilidade pela percepção da natureza e da simplicidade das relações humanas. Desta forma, exorta que o riso é saudável e poético porque a beleza está em todo lugar, desde que os olhos da alma estejam abertos para apreender o mundo com sua cosmovisão.
VOU CONTINUAR NAS MINHAS CONVICÇÕES
Por isto, vou continuar na mesmice das minhas convicções sobre a vida, sustentada nessa crença, nessa cosmovisão, apesar dos reclames do realismo estéril da virtude e da beleza da graça. Apesar da pregação sobre a laicidade, firmo a minha convicção teológica sobre a existência de Yavé, sobre uma vida de propósito, de uma existência predestinada. Acredito na vida como uma história escrita no sacrifício diário de suor e sangue, na aflição, na ansiedade, na dor, mas, sobretudo, na alegria, no amor e na esperança.
Vou continuar a viver na fé que sustenta essa força para erguer a espada contra todos os males que afligem o espírito. A fé é uma arma contra a discórdia e o desamor, pois a fé é a filha mais velha do amor. A fidelidade como gomo do amor tem o mesmo sabor da mansidão, da alegria, da paciência e do domínio próprio. Assim, a busca da perfeição é um ideal a ser perseguido como utopia festiva e cada degrau deve ser comemorado com festa.
Vou continuar a viver indiferente da opinião dominante, expressar minhas próprias idéias mesmo que seja censurado por alguns. Prefiro ser autêntico a ser politicamente correto e fazer da minha sinceridade o retrato do meu caráter, fugindo do jogo de cena costumeiramente adotado pela política da boa convivência.
Vou continuar a verbalizar o meu compromisso ao direito ao respeito ao próximo, em suas vertentes da vontade, da identidade, do ideal e das ações. Toda crítica a comportamentos e atitudes estão firmadas na livre expressão do pensamento, sem afrontar a dignidade de alguém. Como Nelson Mandela prego o respeito à integridade do maior adversário que possa defrontar. A denúncia do erro é impessoal; ou seja, não privilegia pessoas e agride outras, é um compromisso com a verdade e o bem-estar do próximo.
Vou continuar a vivenciar a felicidade de ouvir a música de Deus nos momentos solitários, fazer auto-estame das motivações para verificar se há algum dano a integridade, se em algum lance fui traído pelo orgulho e pela autoconfiança. Claro, a autoconfiança é causa da queda de muitos que se julgavam intocáveis, poderosos, inatingíveis.
Vou continuar a não confiar no poder dos homens como se por meio deles se alcançar algum favor. Passei a acreditar no meu potencial e a honrar o compromisso que fiz em minhas entranhas de ser fiel às minhas convicções, de fazer do trabalho uma profissão de fé. Não ter o trabalho como um fim em si mesmo, mas considerar um altar de sacrifício devocional e, desta forma, as convenções laborais são apêndices de um ideal mais elevado. Por isto, a tristeza do cansaço é parte do sacrifício devocional e não se compara a gloria da alegria da profissão de fé.
CONCLUSÃO
A poesia é um retrato pintado da realidade pelo olhar de quem sonha. Até a tristeza se converte em beleza para quem vê o mundo pelos olhos da alma. Por isto, acredito no carpie dien: “viver intensamente a vida como se estivesse colher um fruto saboroso a cada dia”.
Apesar da incerteza de hoje e de amanhã, acredito que o fruto de amanhã será mais saboroso, pois a experiência traz consigo a sabedoria para discernir as armadilhas do caminho. Assim, não serei guiado pelo impulso, pois trago em meu corpo as marcas dos acoites dos erros cometido em vida. Os fracassos são legados que nos ensinam a não repetir os mesmos erros e o convite a escrever uma nova história.
REFERÊNCIAS
ALVES, Rubem, O céu numa flor silvestre: a beleza em todas as coisas. São Paulo: Versus Editora, 2008.
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